quarta-feira, 21 de março de 2007

TODOS TIVEMOS OS NOSSOS MODELOS E OS NOSSOS HERÓIS


Três dias sem consultar o nosso blog...Passou de 1122 para 1328 visitas! Devorei “Memórias de mim” Relí “voltar a ser médico” (vou encomendar) e “pàra, escuta e olha” , com o comentário do E. Bento que partilho a 200%.
O Nelson pôs fim à primeira jogada do quem é quem. Não consigo memorizar as feições do Igreja nem consigo vê-lo numa situação concreta. Todos os outros, mesmo o Lino, que nunca mais ví e de que até tenho saudades, recordo-os perfeitamente. Manuel Rufino dos Santos é o seu nome ordenado...Foi o meu cùmplice de Roma...Quase meio século! É por isso que não temos tempo a perder, a não ser que penseis que isto é tempo perdido. Eu tenho a certeza que não. Tocou-me o comentário do E. Bento no que se refere ao Pe Miguel de que falarei adeante. O Matisse não teve grande sucèsso, só votou o J. Moreno.
E. Bento, ao ler o elogio que fizeste do Pe Miguel, invadiu-me uma paz e uma força tranquila que ele me comunicava naturalmente, muitas vezes sem uma palavra, mas únicamente com a sua presença. Outra grande força que me ajudou a crescer, desde a minha infância, foi a do Pe Tomás Videira. Destes dois homens que encarnavam para mim a Santidade jovem e a Santidade adulta, não recordo grandes discursos, mas certas atitudes e uma grande humanidade. Tive a nítida impressão que nestes dois homens a graça operava sem destruir a natureza. Não vou falar do Pe Miguel pois não quero faze-lo corar, o que fazia parte do seu ‘charme’. Vou citar três ou quatro momentos partilhados com o Pe Tomás Videira.
1° Certo dia, as retretes ao lado da capela, estavam completamente entupidas. O Pe Tomás chamou-me. Havia m..... por todo o lado.
Vamos a isto, disse ele. O quê? E como? Faz como eu, respondeu, juntando o gesto à palavra... Arregaçou a manga direita do hábito, entalou as fraldas no cinto e toca a meter a mão no fundo da retrete, a tirar tudo para um balde... Depois de termos desentopido as quatro ou cinco retretes e de termos lavado o chão, lavámos também as mãos e os braços com lexívia. Sentí-me orgulhoso por ter-me ultrapassado. Lição extraordinária...
2° No fim de um ano de noviciado o Capitulo achou que eu não merecia fazer a profissão e impuseram-me três meses suplementares. Foi certamente durante estes três mêses que fui noviço com o J. Moreno. Ver os colegas professar, ficando eu de lado,constituía para mim uma humilhação que não estava disposto a soportar e disse ao Pe Tomás que não podia transformar-me em três meses e que portanto ia-me embora. Espera mais algum tempo, disse-me ele, o capitulo quis precisamente testar a tua humildade pois pensam que és muito orgulhoso. E acrescentou, com grande humanidade: eu sei que não é orgulho, é teimosia, devido às tuas origens Trasmontanas. O Pe Tomás também era Trasmontano...Falou-me longamente do carácter rude dos Trasmontanos, do Miguel Torga que ele conhecia pessoalmente,creio...e fiquei.
3° Quatro anos depois, sendo Provincial o Pe Sylvain, fui autorizado a partir para França durante um ano. Quando regressei em 1966 tinha sido eleito Provincial o Pe Raúl de Almeida Rolo que me disse sem preâmbulos: precisamos de um professor de françês no colégio do Clenardo em Lisboa, não precisas de desfazer a mala, estão là à tua espera para te dar outras instruções. A minha surpresa foi enorme e disse-lhe: peço desculpa, mas abandonei os estudos durante um ano, e agora quero prosseguir os estudos de Teologia. E que fazes do voto de obediência? Prosseguiu ele. Aí compreendi que na verdade não desfaria a mala, pois voltava para França. Respondí-lhe, pensando que já não havia nada a fazer, fiz voto de obediência à Ordem dos Pregadores e não à ordem dos professores, e saí. Fui ter com o Pe Tomás que me disse: és mesmo trasmontano! Vou ver o que posso fazer...Graças ao Pe Tomás fiquei em Fátima mais um ano, mas depois ninguém nos pôde salvar da ‘diáspora’. Durante o seu mandato de três anos o Pe Raúl veio a Roma e ao Angélicum, onde o cruzei naqueles grandes corredores. Voltei sempre a cara para o lado e nunca mais o saudei. Afinal o que o Santo Pe Tomás Videira atribuía ao meu carácter de trasmontano rude, era orgulho do mais refinado. Penso que neste domínio não mudei mesmo nada, (chassez le naturel il revient au galop) mas ganhei em tolerância e em respeito dos outros e de suas ideis, com a condição que não pretendam impôr-mas.
4° Já me aconteceu fechar os olhos e repassar um filme com o frei Reginaldo, (caça balões). Estavamos no claustro, a lavar as mãos antes de entrar para o refeitório. O frei Reginaldo esbracejava à volta do Pe Tomás tentando convencê-lo de algo que para ele era importantíssimo. O Pe Tomás acenava com a cabeça sem dizer palavra, fazendo prova de uma paciência legendária...O outro não desarmava... e a cena prolongou-se durante alguns minutos. O Pe Tomás até fervia por dentro, mas tentava dominar-se. Ví então com grande surpresa o Pe Tomás completamente excedido, rasgar a toalha a que se limpava as mãos, sempre em silêncio total. O frei Reginaldo ficou paralizado o não caçou mais balões. O Pe Tomás sorriu de forma angélica e seguiu para o refeitório... É assim que eu imagino a santidade. O homem fica inteiro, escuta e respeita os outros e é Santo, mesmo se de vez em quando rasga um farrapo!
Um abraço do Fernando




1 comentário:

Anónimo disse...

Cada dia aprendo contigo, Fernando. São estas histórias - que tu contas - que fizeram e fazem a nossa vida. Como tu recomendas, aproveitemos o tempo (carpe diem), não deitemos fora esses pedaços de vida, mas recuperemo-los do olvido. Eu sou a minha memória.
Quanto ao nosso emblema, eu também votei no Matisse e o Celestino fez-lhe um erudito comentário, muito interessante.
Eduardo Bento