sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Saudade: o Bilhete de Identidade do Povo Português? Por Julie Champagne

Meus caros amigos,

Ao preparar uma série de emissões sobre a saudade, para a “Radio Altitude”, radio portuguesa baseada em Clermont ferrand, deparei com este texto, magnífico, que eu gostaria de ter escrito pois corresponde a tudo o que eu penso, viví e ainda sinto... Até mesmo a descrição da cidade de Essaouira, que os marroquinos apelidam de “o porto português, (onde passei férias há um mês) corresponde ao que vivi e ressenti. Um muito obrigado a Julie Champagne. O nome é muito lindo e bem françês, mas só alguém com uma alma portuguesa pode escrever de forma tão justa e com tanto sentimento, sobre a saudade. É com a devida vénia e agradecimentos que transcrevemos este texto no nosso blog. Fernando.


Quando ouvem a palavra saudade são muitos os que pensam: - Ah sim, a saudade, a palavra que não se pode traduzir e que identifica os portugueses. Mas a saudade não é uma palavra, não é o bilhete de identidade dos portugueses; a saudade não se pode perceber nem definir, mas apenas viver, experienciar. A saudade expressa-se em sentimentos, música, poemas, cantos mas, certamente, não é com palavras que a podemos traduzir. Antes de ser pensada a suadade foi cantada considera Eduardo Lourenço no seu Labirinto da Saudade.


São tantos os que já procuraram definir a saudade como tantas são as hipóteses que colocaram para descrevê-la, mas a melhor maneira de compreendê-la é ir a Portugal, misturar-se com os portugueses e mergulhar na cultura lusitana.

Tal como o filho que apresenta, simultaneamente, características da mãe e do pai, assim a saudade é, igualmente, uma mistura de muitos sentimentos: melancolia, nostalgia, monotonia, tédio, esperança, desespero, tristeza, conforto, etc. Alegrar-se de sofrer, sofrer por se sentir alegre…

O conceito de saudade tem o seu locus nascendi algures em Marrocos, onde Dom Sebastião morreu mas ninguém pôde testemunhar a sua morte. Assim começou o movimento, quase seita, do sebastianismo, na qual os discípulos crêem que Dom Sebastião não morreu na batalha e que voltará num dia de nevoeiro, para que reine de novo a glória e a força do Portugal das Descobertas. Por isso, a saudade portuguesa exprime, entre outras coisas, o passado que foi e o futuro que nunca será. Um grande paradoxo que vivem os portugueses face às esperanças que têm no futuro de Portugal. Sonham com um destino maravilhoso, idêntico à época das Descobertas e, ao mesmo tempo, não fazem nada e não esperam nada porque não crêem que Portugal possa brilhar de novo. Em vez de baixar as expectativas que têm para o seu país, os portugueses preferem viver no passado e deixar passar o presente. Trata-se de um passado futuro! Escutemos Álvaro de Campos na sua Tabacaria: Não sou nada. Nunca serei nada. Não posso querer ser nada. À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.


A saudade que sentem os portugueses pode eventualmente ser explicada geograficamente. Com efeito, Portugal é um país pequeno cercado pelo mar, quase como uma ilha, que predispõe os seus habitantes a deixarem o continente. Não é por isso, supreendente a vontade que os portugueses têm em se virarem para o mundo, lançando-se ao mar. Os portugueses não gostam de limites

e, por isso, evitam-nos. Os portugueses gostam de desafios; ficam tristes quando falham, mas ficariam ainda mais tristes se não tivessem tentado. As descobertas portugueses situam-se, algures, no passado porque as colónias já o foram. De todo o lado onde os portugueses chegaram, deixam e trazem lembranças da sua passagem. Da arquitectura à língua, de Marrocos à China, passando pela Índia, Japão e Timor.


Por exemplo, quando fui a Morrocos, visitei a cidade de Essa ouira (antiga Mogador), uma pequena cidade portuária, que, pela sua situação geográfica foi acossada por muitos visitantes indesejados. Mas a influência mais marcante que nela se inscreve é a que os portugueses deixaram. Muitos edifícios da cidade apresentam uma arquitectura bem portuguesa, sobre tudo a fortaleza.


E os portugueses mobilizaram o recurso mais poderoso para as descobertas : o mar! Foi com o mar que chegaram até mundos desconhecidos e também foi o mar que definiu o reino do Portugal das Descobertas. Por isso, Portugal foi cobiçado mais de uma vez pelos seus vizinhos e saudosos inimigos de estimação. O mar também foi, e ainda é, indispensável à alimentação e prosperidade dos portugueses. No entanto, os portugueses não conseguem pensar o mar sem saudade, porque o mar venturoso também matou muitos deles: exploradores, navegadores, pescadores, homens, mulheres, crianças, esposos, esposas, filhos, filhas, mães, pais, avôs, avós, irmãos, irmãs, tios, tias, primos, primas, amigos, amigas, etc. O mar conferiu -e confere ainda - poder aos portugueses mas também lhes mostra, às vezes, que é maior do que eles. Esta dura lição de humildade, esta impotência, esta imprevisibilidade e este paradoxo do mar são componentes do grande sentimento da saudade.


Ah, todo o cais é uma saudade de pedra!

E quando o navio larga do cais

E se repara de repente que se abriu um espaço

Entre o cais e o navio,

Vem-me, não sei porquê, uma angústia recente,

Uma névoa de sentimentos de tristeza

Que brilha ao sol das minhas angústias relvadas

Como a primeira janela onde a madrugada bate,

E me envolve como uma recordação duma outra pessoa

Que fôsse misteriosamente minha.

-Álvaro de Campos (Ode Marítima)


A saudade também influenciou muito a cultura portuguesa inspirando autores, pintores e músicos. A saudade lê-se, vê-se e ouve-se. O Fado representa o melhor exemplo da influência da saudade no mundo da música, sobretudo quando cantado pela voz fabulosa e autêntica da Amália Rodrigues. Esta combinação única e mágica de cantos e de guitarra portuguesa conquistou amadores de música em todo o planeta, como os grandes exploradores portugueses conquistaram o mar. Raras são as pessoas que escapam às emoções quando ouvem o fado. A intensidade dos sentimentos e a concentração da saudade, presentes na língua internacional

da música, comovem o público e também nós podemos viver a saudade nem que seja apenas por um instante.


Eu só entendo o fado

pla gente amargurada à noite a soluçar baixinho

que chega ao coração num tom magoado

tão frio como as neves do caminho

que chora uma saudade ou canta ansiedade

de quem tem por amor chorado

dirão que isto é fatal, é natural

mas é lisboeta

e isto é que é o fado

- Amália Rodrigues

(Fado Lisboeta)


Na literatura, podem-se encontrar muitos autores inspirados na saudade. Os seus textos transpiram uma saudade tangível, como o cheiro a peixe nos portos de Portugal. Encontramos esta atmosfera da saudade, de cortar à faca, na poesia de Fernando Pessoa e dos seus heterónimos, especialmente em O Marinheiro e Tabacaria.

Só o mar das outras terras é que é belo.

Aquele que nós vemos dá-nos sempre saudades daquele que não veremos nunca...- Fernando Pessoa (O Marinheiro)

Luís de Camões é outro grande poeta português que canta a saudade. A sua obra memorável é uma epopeia moderna sobre as Grandes Explorações e Descobertas dos Portugueses. Os dez cantos d'Os Lusíadas - Lusíadas vem do povo lusitano, os antepassados dos portugueses - não falam somente das aventuras e dos eventos históricos que rodeiam as explorações e as descobertas, mas também falam dos sentimentos e da personalidade dos exploradores. Camões dá uma alma a esta narração que revive debaixo da sua pena com tinta de mar.


E também as memórias gloriosas

Daqueles Reis, que foram dilatando

A Fé, o Império, e as terras viciosas

De África e de Ásia andaram devastando;

E aqueles, que por obras valerosas

Se vão da lei da morte libertando;

Cantando espalharei por toda parte,

Se a tanto me ajudar o engenho e arte.

Luís de Camões (Os Lusíadas, Canto I)


Há que referir ainda que a paixão dos portugueses por tudo o que fazem, por tudo o que vivem também faz parte da saudade. Têm uma paixão pela vida, pelo mar, pela música, pela boa comida e bom vinho, pela língua portuguesa, etc. E também vivem o amor com paixão. Desejos impossíveis, desejos que insuflam a vida nos apaixonados. Os desejos satisfeitos cortam o prazer de sofrer, de ser privado. Um bom exemplo disso é o suicídio de Mário de Sá-Carneiro quando se apercebeu que a mulher que cobiçava, apesar de prostituta, também o amava!


Olho em volta de mim. Todos possuem -

Um afecto, um sorriso ou um abraço.

Só para mim as ânsias se diluem

E não possuo mesmo quando enlaço.

Mário de Sá-Carneiro (Como eu não possuo)


Por outro lado, é também significativa a paixão dos portugueses pela pátria. Muitos, vivem, agora, noutros países, mas ninguém deixou Portugal porque não gostava da cultura ou do país. Alguns deixaram Portugal com a esperança de uma vida melhor, para si e para os filhos. Mas, sobretudo, os portugueses saiam de Portugal para ter a oportunidade de ter saudades da pátria e da cultura lusitana! Para eles, ter saudades é um prazer e este prazer quase sádico representa um outro paradoxo do povo português. Todos os portugueses que encontrei no Quebeque têm orgulho em ser portugueses e não renegam as raízes portugueses. Pelo contrário, querem que os filhos nascidos fora de Portugal, falem Português e conheçam a cultura e a história dos seus antepassados. E, por isso, acho que a cultura portuguesa será sempre bem viva e bem conhecida.


Amor da Pátria

Vereis amor da pátria, não movido

De prêmio vil, mas alto e quase eterno:

Que não é prêmio vil ser conhecido

Por um pregão do ninho meu paterno.

Ouvi: vereis o nome engrandecido

Daqueles de quem sois senhor supremo,

E julgareis qual é mais excelente,

Se ser do mundo Rei, se de tal gente.

Luís de Camões (Os Lusíadas, Canto I)


Há que acrescentar ainda: os portugueses são patriotas mas também muito pacifistas (brandos costumes oblige). Gostam das cultura portuguesa e querem que seja conhecida em todo o lado, mas não a impões, defendem ou promovem, como outros povos que conhecemos muito bem. Não querem converter todos em portugueses, mas apenas difundir a cultura e a língua portuguesa através do mundo.

Em conclusão, os portugueses não têm a tecnologia dos japoneses, a população dos chineses, o rigor dos alemães, a pontualidade dos suíços, a siesta dos espanhois, os queijos dos franceses, o Vaticano dos italianos, a estupidez dos americanos (graças a Deus!), mas têm a saudade. A bem dizer, não têm a saudade mas são a saudade: na cultura, na língua, na cozinha, na música, na literatura, no coração, na alma. E para todo o lado para onde vão, trazem com eles esta saudade e transmitem o amor de Portugal aos que encontram no caminho.

Para acabar, deixo aqui um poema meu, cuja inspiração me foi aparecendo, no decorrer da realização deste trabalho sobre a saudade. É a minha interpretação desse sentimento bem português, que apenas a arte pode expressar convenientemente...


Saudade

Uma lágrima de tinta

Que toca uma guitarra

Uma lágrima de tristeza

Uma lágrima de alegria

Uma lágrima de melancolia

Uma lágrima de euforia :

Uma melodia única

Salgada como o mar

Que faz voltar os navios

Como os corações vazios

Fado tinto de azul

Como os olhos da musa

Uma melodia única

Um sentimento português

Uma identidade sem idade

A saudade sem idade

Referências :

LOURENÇO Eduardo (1997), Mythologie de la Saudade. Série Lusitane, Editions Chandeigne, 206 p.

DE CAMPOS Álvaro (1997), Ode Marítima; Ode Triunfal; Opiário; Tabacaria. Lisboa, Contexto, 74p., ISBN 972-26-1364-2

PESSOA Fernando (1952), Poemas Dramáticos. Colecção poesia, Edições Ática.

DE CAMÕES Luís (1572), Os Lusíadas. Edição do Instituto Camões, www.instituto-camoes.pt/

DE SÁ-CARNEIRO Mário (1914) Dispersão. Lisboa


Fr. Marcos - 29 de Outubro - Parabéns!...

Embora com algum atraso, queremos deixar aqui as mais sinceras felicitações a este dominicano (Joaquim Valentim Pereira Vilar) lá dos rincões do Minho, místico, homem de fé e de ciência, que no dia 29 completou 72 anos. Parabéns!...
Nelson

terça-feira, 28 de outubro de 2008

História sempre actual - "Criar Laços"

Olá amigos!
Ao tentar encontrar o nosso blog através do Google, para o enquadrar nos favoritos, fui parar a um texto com o título “Criar laços” retirado de “O Principezinho”.
Muitos de nós já terão lido este texto. Mas a sua apreciação fora do contexto, impressionante pela sua acuidade , leva-me a deixar aqui esta transcrição, com a devida vénia e consideração pelo autor e por quem antes de mim o retirou do mesmo livro. Releiam os que leram, leiam aos filhos ou aos netos, pois parece-me que vale a pena :


“ Foi então que apareceu a raposa.
- Olá, bom dia! - disse a raposa.
- Olá, bom dia! - respondeu delicadamente o principezinho que se voltou mas não viu ninguém.
- Estou aqui - disse a voz - debaixo da macieira.
- Quem és tu? - perguntou o principezinho. - És bem bonita...
- Sou uma raposa - disse a raposa.
- Anda brincar comigo - pediu-lhe o principezinho. - Estou triste...
- Não posso ir brincar contigo - disse a raposa. - Não estou presa...
- AH! Então, desculpa! - disse o principezinho.
Mas pôs-se a pensar, a pensar, e acabou por perguntar:
- O que é que "estar preso" quer dizer?
- Vê-se logo que não és de cá - disse a raposa. - De que é que tu andas à procura?
- Ando à procura dos homens - disse o principezinho. - O que é que "estar preso" quer dizer?
- Os homens têm espingardas e passam o tempo a caçar - disse a raposa. - É uma grande maçada! E também fazem criação de galinhas! Aliás, na minha opinião, é a única coisa interessante que eles têm. Andas à procura de galinhas?
- Não - disse o principezinho. Ando à procura de amigos. O que é que "estar preso" quer dizer?
- É a única coisa que toda a gente se esqueceu - disse a raposa. - Quer dizer que se está ligado a alguém, que se criaram laços com alguém.
- Laços?
- Sim, laços - disse a raposa. - Ora vê: por enquanto, para mim, tu não és senão um rapazinho perfeitamente igual a outros cem mil rapazinhos. E eu não preciso de ti. E tu também não precisas de mim. Por enquanto, para ti, eu não sou senão uma raposa igual a outras cem mil raposas. Mas, se tu me prenderes a ti, passamos a precisar um do outro. Passas a ser único no mundo para mim. E, para ti, eu também passo a ser única no mundo...
- Parece-me que estou a começar a perceber - disse o principezinho. - Sabes, há uma certa flor...tenho a impressão que estou presa a ela...
- É bem possivel - disse a raposa. - Vê-se cada coisa cá na Terra...
- OH! Mas não é da Terra! - disse o principezinho.
A raposa pareceu ficar muito intrigada.
- Então, é noutro planeta?
- É.
- E nesse tal planeta há caçadores?
- Não.
- Começo a achar-lhe alguma graça...E galinhas?
- Não.
- Não há bela sem senão...- disse a raposa.
Mas a raposa voltou a insistir na sua ideia:
- Tenho uma vida terrivelmente monótona. Eu, caço galinhas e os homens, caçam-me a mim. As galinhas são todas iguais umas às outras e os homens são todos iguais uns aos outros. Por isso, às vezes, aborreço-me um bocado. Mas, se tu me prenderes a ti, a minha vida fica cheia de sol. Fico a conhecer uns passos diferentes de todos os outros passos. Os outros passos fazem-me fugir para debaixo da terra. Os teus hão-de chamar-me para fora da toca, como uma música. E depois, olha! Estás a ver, ali adiante, aqueles campos de trigo? Eu não como pão e, por isso, o trigo não me serve de nada. Os campos de trigo não me fazem lembrar de nada. E é uma triste coisa! Mas os teus cabelos são da cor do ouro. Então, quando eu estiver presa a ti, vai ser maravilhoso! Como o trigo é dourado, há-de fazer-me lembrar de ti. E hei-de gostar do barulho do vento a bater no trigo...
A raposa calou-se e ficou a olhar durante muito tempo para o principezinho.
- Por favor...Prende-me a ti! - acabou finalmente por dizer.
- Eu bem gostava - respondeu o principezinho - mas não tenho muito tempo. Tenho amigos para descobrir e uma data de coisas para conhecer...
- Só conhecemos as coisas que prendemos a nós - disse a raposa. - Os homens, agora, já não têm tempo para conhecer nada. Compram as coisas já feitas nos vendedores. Mas como não há vendedores de amigos, os homens já não têm amigos. Se queres um amigo, prende-me a ti!
- E o que é que é preciso fazer? - perguntou o principezinho.
- É preciso ter muita paciência. Primeiro, sentas-te um bocadinho afastado de mim, assim, em cima da relva. Eu olho para ti pelo canto do olho e tu não me dizes nada. A linguagem é uma fonte de mal entendidos. Mas todos os dias te podes sentar um bocadinho mais perto...
O principezinho voltou no dia seguinte.
- Era melhor teres vindo à mesma hora - disse a raposa. Se vieres, por exemplo, às quatro horas, às três, já eu começo a ser feliz. E quanto mais perto for da hora, mais feliz me sentirei. Às quatro em ponto já hei-de estar toda agitada e inquieta: é o preço da felicidade! Mas se chegares a uma hora qualquer, eu nunca saberei a que horas é que hei-de começar a arranjar o meu coração, a vesti-lo, a pô-lo bonito...São precisos rituais.
- O que é um ritual? - perguntou o principezinho.
- Também é uma coisa de que toda a gente se esqueceu - respondeu a raposa. - É o que faz com que um dia seja diferente dos outros dias e uma hora, diferente das outras horas. Os meus caçadores, por exemplo, têm um ritual, à quinta-feira, vão ao baile com as raparigas da aldeia. Assim, a quinta-feira é um dia maravilhoso. Eu posso ir passear para as vinhas. Se os caçadores fossem ao baile num dia qualquer, os dias eram todos iguais uns aos outros e eu nunca tinha férias.
Foi assim que o principezinho prendeu a raposa. E quando chegou a hora da despedida:
- Ai! - exclamou a raposa - ai que me vou pôr a chorar...
- A culpa é tua - disse o principezinho.- Eu bem não queria que te acontecesse mal nenhum, mas tu quiseste que eu te prendesse a mim...
- Pois quis - disse a raposa.
- Mas agora vais-te pôr a chorar! - disse o principezinho.
- Pois vou - disse a raposa.
- Então não ganhaste nada com isso!
- Ai isso é que ganhei! - disse a raposa. - Por causa da cor do trigo...
Depois acrescentou:
- Anda, vai ver outra vez as rosas. Vais perceber que a tua é única no mundo. Quando vieres ter comigo, dou-te um presente de despedida: conto-te um segredo.
O principezinho lá foi ver as rosas outra vez.
- Vocês não são nada parecidas com a minha rosa! Vocês ainda não são nada - disse-lhes ele. - Não há ninguém preso a vocês e vocês não estão presas a ninguém. Vocês são como a minha raposa era. Era uma raposa perfeitamente igual a outras cem mil raposas. Mas eu tornei-a minha amiga e, agora, ela é única no mundo.
E as rosas ficaram bastante incomodadas.
- Vocês são bonitas, mas vazias - ainda lhes disse o principezinho. - Não se pode morrer por vocês. Claro que, para um transeunte qualquer, a minha rosa é perfeitamente igual a vocês. Mas, sózinha, vale mais do que vocês todas juntas, porque foi a que eu reguei. Porque foi a ela que eu pus debaixo de uma redoma. Porque foi ela que eu abriguei com o biombo.. Porque foi a ela que eu matei as lagartas (menos duas ou três, por causa das borboletas). Porque foi a ela que eu vi queixar-se, gabar-se e até, às vezes, calar-se. Porque ela é a minha rosa.
E então voltou para o pé da raposa e disse:
- Adeus...
- Adeus - disse a raposa. Vou-te contar o tal segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos...
- O essencial é invisível para os olhos - repetiu o principezinho, para nunca mais se esquecer.
- Foi o tempo que tu perdeste com a tua rosa que tornou a tua rosa tão importante.
- Foi o tempo que eu perdi com a minha rosa... - repetiu o principezinho, para nunca mais se esquecer.
- Os homens já se esqueceram desta verdade - disse a raposa. - Mas tu não te deves esquecer dela. Ficas responsável para todo o sempre por aquilo que está preso a ti. Tu és responsável pela tua rosa...
- Sou responsável pela minha rosa... - repetiu o principezinho, para nunca mais se esquecer.”

Antoine de Saint-Exupéry, O Principezinho

Espero que relembrem com bom gosto esta passagem e quem sabe o restante livro.

Criemos laços.


2008-10-28.
Antero Monteiro

domingo, 26 de outubro de 2008

"HÁ HÓSTIAS E VINHO DE MISSA"


A paciência da justiça tinha enchido o seu cálice. A plateia bebia todas as definições mas continuava sedenta de justiça. “Perguntado sobre o que de mais injusto lavra no país, o cidadão avulso não hesita: a Justiça”. O próprio “rafeiro” não via maneira de chegar a sua vez de roer os despojos da “costeleta” e do “entrecosto”. Promessas, só promessas, pensava ele com as suas pulgas.
Os frades anciãos mastigavam a angústia de segurar a barra mesmo sem forças, por não terem a quem passar o testemunho. Não é justo. Noutros tempos “muitos eram os chamados e poucos os escolhidos”. Hoje não há escolha possível, porque os chamados não comparecem. Este Outono de décadas suplanta sem violência, as intenções do Joaquim Augusto de Aguiar ou do Marquês de Pombal. Os próprios ex, dentro de anos não terão continuadores. Por agora, reforcem os laços horizontais, porque atrás parece que não vem ninguém. A não ser que respondam ao apelo do frei Bernardo Domingues “tragam os vossos netos para a Ordem, carago”.
Faz-se um passeio higiénico pela cidade para prolongar o parco convívio anual. Se houvera uma tasca beber-se-ia mais um copo para animar a conversa. Deambula-se por entre as lojas com montras recheadas de santinhos de confeitaria, galos de Barcelos e bandeiras do Benfica. Façam-me um favor: não lhe chamem comércio religioso. Soa a obsceno.
Vem-me ao pensamento a imagem do Cristo indignado. Aí, o Deus que viveu a humanidade, foi profundamente humano. Por uma vez “perdeu as estribeiras”, derrubando tendas e expulsando os vendilhões do Templo, a chicote.
Helas! Há imaginação por aqui. O marketing renova-se. Um cartaz contrasta com os rosas, os encarnados e os azuis celestes, dominantes. Sobre o branco da folha A4 anuncia-se em “arial black” tamanho 58: “HÁ HÓSTIAS E VINHO DE MISSA”

Ezequiel Vintém
(não confundir com Ezequiel Lucas – façam-lhe justiça)

sábado, 25 de outubro de 2008

TURMA DE 1965-1969 ALDEIA NOVA - Antero Monteiro



Soube há dias deste blog, pelo Isidro Dias, companheiro da minha turma em cinco anos seguidos, considerado ao tempo o crânio das matemáticas. E de outras disciplinas também. Mas com a matemática nunca me entendi muito bem, portanto era nessa vertente que mais me surpreendia.
A iniciativa do blog condiz com os tempos que vivemos e aproxima-nos em qualquer parte do planeta que nos situemos.
Apresso-me nesta altura a manifestar a minha atenção a este meio de comunicação e a relembrar aqueles colegas, “condenados” a ser amigos pela vida fora, mesmo sem falarmos nem nos encontrarmos.
Com muito contentamento, vejo relembrar nestas páginas o nome dos nossos colegas e mestres de referência. Por isso serei um frequente visitante e, uma ou outra vez interveniente, quando entender que tenho coisas a transmitir.
Deixem-me lembrar-vos da minha turma: muitos beirões, transmontanos, e não só:
- dos amigos, que sei onde param ou como os contactar: Manuel Guerra Henriques, Domingos Carvalhais, Luís Sousa Guedes, Isidro Dias, José Luís ( meu conterrâneo - ambos somos da terra do saudoso Ernesto Taborda), António Farinha, António Costa Martins, Dinis Santos, Carlos Alberto Vicente, Carlos Pinto.
- e dos que não encontrei mais mas gostaria de rever e contactar: Vítor Frazão, Pedro Tudela, Diamantino, Sabença, Manuel Domingues, Leonel e, claro, todos aqueles de cujo nome não me recordo neste momento, mas que sabem que lhes reservo idêntica estima e amizade.
Deixei de fora, propositadamente, o malogrado Faustino Simões que via com frequência, e com quem em cada encontro revivia, sempre com vivacidade contagiante, as nossas aventuras e desventuras, cheios do contentamento daquelas histórias que muitos de vós conhecem, qual “clube dos poetas mortos”, perpassando por nós no seu melhor, quarenta anos depois.
Esta minha turma era uma grande turma. Os mestres e dirigentes foram grandes. Deles, dos mestres, espero falar noutra oportunidade. Com a saudade dos tempos passados, como base sólida de construção do presente e do futuro, preservando os laços que nos hão-de unir sempre.

(Lisboa, em 2008-10-24)

Antero dos Santos Monteiro
asmont@netcabo.pt
PS.- Amigos José Celestino e Ferraz, parabéns por manterem a chama e terem facultado aos que (como eu) não compareceram nos últimos encontros imagens

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

BRASIL, IMENSO - por Manuel Branco Mendes


De ilusão em ilusão,
Começa-se pela primeira, a história do achamento, que foi uma grande história e que da história ficou claro que só com a falência da miragem do oriente o luso épico manhosismo para ali se foi iludir.
Ele foi atrás do ouro, embrenhando-se nos sertões da Capitania de Minas Gerais, e regressando ‘mineiro’, boçal e rico.
Ele inventou essa triangulação amorosa conhecida por ‘casa grande e senzala’, e o ouro se transformou em açúcar.
Ele foi colono e, com a independência, virou emigrante e, regressado rico e ostentoso, era o ‘brasileiro’.
Era, por isso, uma terra de crescimento, suportada pela catequização do índio autóctone, pela escravatura do preto arrancado de África e pelas fomes fugidas da Europa e, até, do Oriente.
Eram os ‘brasis’, equivalente luso do’El Dorado’ ali, mais acima.
E foi essa terra, fecundada pelo tudo de uns e pelo nada de outros, que acabou por ficar túrgida de coronéis Floro Bartolomeu e outros, de cangaceiros Corisco, Lampião e mais, de Estado Novo e de ditaduras militares de Castello Branco, Costa e Silva, Geisel, Figueiredo, de guerrilha urbana de Marighela e Lamarca e de democracia de ‘directas, já’!
O que foi e até hoje.


Há um imenso Brasil de riqueza
Em 2002 a Petrobrás comprou a maior empresa petrolífera da Argentina por mais de mil milhões de dólares e depois, em 2005, um grupo cimenteiro brasileiro adquiriu uma sua congénere também argentina por outros mil milhões de dólares, em 2006 a aquisição de uma das maiores empresas de minério do Canadá representou um negócio de dezoito mil milhões de dólares e em 2008 a compra da americana Anheuser-Busch por cinquenta e dois mil milhões de dólares, transformou a InBev na maior indústria cervejeira do mundo.
É ainda este país que assegura 27% do mercado mundial de soja, num crescimento ‘chinês’ superior a 10% ao ano, que produz um em cada três bifes de vaca vendidos no mundo e que é o maior exportador mundial de frango, com receitas de cinco mil milhões de dólares em 2007
.
[1]

Há um imenso Brasil de pobreza
O salário mínimo é de R$ 415 (160 €), para os que trabalham.
Sem trabalho garantido e com um rendimento regular ou inferior a R$ 120 (50 €) contabilizam-se cerca de 11 milhões de famílias, num total de cerca de 45 milhões de pessoas (1/4 da população) para os quais, desde 2003, foi instituída a bolsa de família – benefício variável entre R$ 15 e 95 (mais ou menos entre 5 e 45€) que tem a única condição de as crianças permanecerem na escola e serem vacinadas. Da importância desta bolsa atesta o facto de 87% do valor da mesma servir para adquirir produtos alimentares.


Há um imenso Brasil de violência
Nos últimos 20 anos o número de assassinatos cresceu 237%, perdendo a vida, vítimas da violência, cerca de 40 000 pessoas, o que representa 11% deste tipo de morte a nível mundial.
Em 2003 o número de reclusos era de 285 000, tendo agora atingido os 340 000 (173 reclusos/100 000 habitantes), cifrando-se o défice de vagas nos estabelecimentos prisionais em mais de 100 000.
E, no entanto, o número de elementos das forças policiais é de 535 000 (1 polícia por cada 304 habitantes, índice comparável à generalidade dos estados europeus ou Estados Unidos.
No entanto também, e paradoxalmente – ou não – o Brasil investe 70 vezes menos que os Estados Unidos no combate à violência, apresentando um índice de violência 88 vezes superior, por exemplo, a França
.
[2]

Há um imenso Brasil de mudança
‘Quem tem fome, tem pressa’, dizia alguém socialmente sem fome mas conhecedor do problema.
E é essa pressa da fome, numa terra demais túrgida de tanta riqueza, que, apesar de tudo, fez crescer o social porque o económico e todos os demais associados caminham nesse sentido de crescimento, numa febre de 40 anos sinteticamente assim retratada:
Em 1970 O Produto Interno Bruto “per capita” era de $ USD 3220 e hoje é de 6884, a esperança de vida era de 53 anos e hoje é de 72 anos, o número médio de filhos por família era de 6 e hoje é de 2, apenas 18% das mulheres estavam no mercado de trabalho e hoje são já mais de 57%, havia 1,3 milhão de telefones fixos e hoje são já mais de 160 milhões de telemóveis, havia 1 carro para 47 pessoas e hoje há um carro para 4 pessoas
.[3]


Há um imenso Brasil de esperança
Deus é brasileiro, rezava a revista The Economist, a propósito das gigantescas descobertas de petróleo que poderão colocar o Brasil ao nível dos maiores produtores mundiais, embora a carecer de um investimento de 600 mil milhões de dólares (para se ter uma ideia, a Petrobrás, em 54 anos da sua existência, investiu um total de 124 mil milhões de dólares...)
[4] para retirar, de 6 quilómetros de profundidade e a cerca de 300 quilómetros da costa, 50 mil milhões de barris de ‘brent’.
“Não vamos nos deslumbrar e sair por aí gastando o que ainda não temos ou torrando dinheiro em bobagens. O pré-sal
[5] é um passaporte para o futuro. Sua principal destinação, repito, deve ser a educação das novas gerações e o combate à pobreza. Vamos investir esses recursos naquilo que temos de mais precioso e promissor: nossos filhos e nossos netos.”
Assim falou Lula da Silva, por ocasião da celebração do dia da independência neste 2008 (7 de Setembro) num actual noivado de 80% de aprovação da sua política por parte do povo brasileiro.


Há um imenso Brasil de futuro
Por isso, e para quem quiser entender, que Brasil é Carnaval, telenovelas, putas, bandidos e jogadores de futebol, informa-se que não. Não, e não não apenas.
Porque para um país que perversamente rasteja com o mensalão
[6] e idealisticamente sobe aos céus agarrado aos seus balões de fantasia [7], há um imenso futuro!


[1] In Revista Veja, Julho de 2008
[2] Artigo de Wlamir Leandro Motta Campos, publicado na Net. O autor é consultor legislativo, especialista em gestão de políticas públicas nas áreas de segurança pública.
[3] In Revista Veja, de Setembro de 2008
[4] In Revista Exame, de Agosto de 2008
[5] As jazidas ora descobertas encontram-se sob um manto de sal de a 4 quilómteros de profundidade e de dois de espessura, sendo, por isso, referido no Brasil genericamente como o ‘pré-sal’
[6] O mensalão, denunciado em 2005, constituiu um dos maiores escândalos da democracia no Brasil. Tratava-se basicamente de um esquema montado por figuras proeminentes do PT que fazia chegar cerca de 30 000 reais por mês aos deputados que garantissem o sue voto favorável às propostas do governo.
[7] Em 2008 o Padre Adelir, de Santa Catarina, e para chamar a atenção para S. Cristóvão, padroeiro dos camionistas, atou-se a 1 000 balões e desapareceu nos céus, nunca mais tendo sido visto...

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

FOTOS DO ENCONTRO 2008

Caros Amigos:
Do lado esquerdo, encontrareis fotografias do nosso último encontro, cedidas pelo José Celestino e pelo Manuel Ferraz. Aos menos familiarizados nestas coisas da informática (como eu), diria que para ampliar basta "clicar" na imagem. Entretanto aguardo todas as reportagens que quiserem fazer o favor de enviar, sejam elas fotográficas ou testemunhos escritos. Seja-me permitido lembrar ao M. Branco Mendes que gostariamos de ler aqui os seus ensinamentos e testemunhos.
Ao vosso dispôr,
Nelson

terça-feira, 21 de outubro de 2008

MANUEL COUTO -22 de Outubro- Parabéns!

Hoje, voltamos a terras da Guia para enviar um grande abraço ao jovem músico e maestro do coro, para além de estar sempre pronto a prestar a sua sabedoria nas artes das electricidades. Votos de saúde e que te disponhas a aparecer.
JM

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

ECOS DO ENCONTRO 2008

Amigos:
Não importa, nem isso se pretende, fazer aqui uma reportagem exaustiva deste nosso Encontro/2008, acontecido em Fátima no pretérito dia 18. Reencontrámo-nos, se não todos, pelos menos aqueles que quisemos e pudemos estar. E aqui, deste meu modesto recanto, queria deixar um abraço de reconhecimento à comissão organizadora pelo esforço e empenhamento evidenciados, tanto no tema escolhido para reflexão, como no painel de conferencistas, tendo para mim como certo que os nossos encontros também valem, por podermos dedicar algum tempo à reflexão sobre temas que marcam o nosso quotidiano e o da sociedade que somos. Felicitar o Frazão e o Gaspar pelo empenhamento e o José Carlos, o Branco Mendes e o fr. Marcos pela oratio sapientiae. Companheiros houve que marcaram presença pela primeira vez e foi bom revê-los ao fim de meio século. Julgo ser oportuno deixar aqui a opinião de todos aqueles que o quiserem fazer. O nosso testemunho, poderá ser importante para melhorar os próximos encontros. Não faltaram repórteres fotográficos e, por tal facto, aguardo as imagens feitas pelo Zé Celestino, Neves de Carvalho e Ferraz. Embora elas valham por mil palavras, venham também estas.
Fico ao vosso dispôr.
Um abraço amigo
Nelson

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

"DEPOIS DE VÁRIAS VISITAS AO BLOG.... " por António Lucas

"Depois de várias (muitas) visitas ao blog, achei que, pelo menos, deveria sair da penumbra para saudar todos os amigos (e pouco mais dizer), já que me falece o engenho e a arte para dizer coisas tão interessantes como as que tenho lido neste ponto de encontro.

Estive em Aldeia Nova, Fátima, Granada, Queluz de Baixo e Av. Barjona de Freitas e em todos estes lugares me foi oferecida pelos dominicanos - desde o P. Tomás ao frei Bento (estudem! estudem!), frei Mateus, frei João Domingos, frei Raimundo, frei Henrique (…quer sejais padres, quer sejais pedreiros, quer sejais carpinteiros, quer sejais pais de família, tendes que saber religião!), frei Pedro e tantos outros – a proposta de sentido da vida e de jeito de viver que certamente, em maior ou menor grau, nos marcou a todos.

Uma proposta que (assim a entendi) passa por "espremer" os nossos dias, os livros, os nossos pensamentos, as pessoas e tudo o mais, na tentativa de que nos revelem algumas respostas que nos possam servir de alimento nesta estadia numa Terra que nos é emprestada por alguns anos.

O jeito de viver que aprendemos nos dominicanos mantém-nos acordados no dia a dia que tantas vezes nos consome sem glória nem proveito e ajuda-nos a dizer não (um gesto que não é tipicamente português, mas que faz falta) … ou será que compensa estar de bem com os outros e de mal connosco ou… ter medo até de ter medo?

Em suma, agora que estou a caminho dos 60 (e com alguns tiques dos anos sessenta), obrigado aos dominicanos pelo desassossego que trouxeram à minha vida."


António Ezequiel P. Lucas – ex-frei Ezequiel
(não confundir com Ezequiel Vintém)
17/10/2008

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

MIGALHÃES -poema de Luis Costa

Chegou-me hoje por e-mail e já deve andar pela blogosfera. Como achei piada e tem muito de verdade, envio aos meus amigos.
Quem ja conhecer, desculpe.
António Silva

Lá vem pelo avelar
O filho do Zé João
Vem do centro escolar
Cansado de palmilhar
A caminho da povoação

Não há médico na aldeia
E a antiga escola fechou
Não tem carne para a ceia
Nem petróleo para a candeia
Porque o dinheiro acabou

O seu pai foi para França
Trabalhar na construção
E a mãe desta criança
Trabalha na vizinhança
Lavando pratos e chão

Mas o puto vem contente
Com o Migalhães na mão
E passa por toda a gente
Em alegria aparente
De quem já sabe a lição

Um senhor muito invulgar
Que chegou com mais senhores
Veio para visitar
O novo centro escolar
E dar os computadores

E lá vem o Joãozinho
No seu contínuo vaivém
Calcorreando o caminho
Desesperando sozinho
À espera da sua mãe

Neste país de papões
A troco de dois vinténs
Agravam-se as disfunções
O rico ganha milhões
E o pobre Migalhães

Luís Costa

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

ÁLVARO MILAGRE -16 de Outubro- PARABÉNS!



Quem não se lembra deste "terrível" sportinguista e amante da organização e participação nos desafios de futebol? Trancoso estava presente neste coração sempre pronto em auxiliar o próximo. Amigo do seu amigo e bom conversador sobre as questões teológicas mais modernas.
Votos de que continues com aquele espírito vivo e cheio de humor para mais um aniversário com saúde.
J.M.

domingo, 12 de outubro de 2008

Fr. BERNARDO DOMINGUES op. -13 de Outubro- PARABÉNS!

Conheci o Padre Bernardo, na casa de seus saudosos Pais, na Missa Nova do seu Irmão fr. Bento. O conhecimento do seu aniversário deu-se no longínquo ano de mil novecentos e sessenta e... na Casa-Estalagem das Irmãs Dominicanas de Fátima. Como o tempo passa..... A amizade e convívio existente foi criada e fortificada graças ao seu irmão Zé Espírito Santo, que agradeço. Para si votos de parabéns com saúde e forças para continuar a acompanhar e acarinhar os Amigos.
J.M

sexta-feira, 10 de outubro de 2008


Caríssimos Companheiros:

Algures falava-se de ETICA, MORAL, JUSTIÇA.
Deixo-vos um comentário para reflexão. E, provavelmente, a possibilidade de vasculhar mais longe para ter uma ideia mais clara da revolta das pessoas…
Um abraço do TREZE
(Filipe Lopes)
« …


Ética e Crise

Ética na Privada
Há crise porque não há ética. As notícias avisam que estamos metidos numa extremamente perigosa crise financeira. As falências sucedem-se. As prestações dos empréstimos da compra de casa aumentam e as famílias não aguentam os encargos. Os salários não chegam para as despesas. A redução do poder de compra paralisa a economia e aumenta o desemprego. Dizem-nos que a crise ainda não saiu do adro, o que significa que ainda há muito escondido, muito para chegar. O que significa que estão para chegar tempos mais difíceis. É uma crise financeira que tem o seu centro nos Estados Unida da América. Os bancos e as seguradoras estão em situação de falência. A crise fez-se e cresceu durante os anos da administração de Bush. Um presidente que chegou ao poder com truques e com batota, que prometeu redução de impostos para dinamizar a iniciativa privada. Mais liberalismo económico e mais mercado. Agora, os bancos estão em falência e os governos acodem, injectando milhões de dólares, dinheiro dos impostos dos contribuintes, para acudir a um sistema arruinado por especulações e por fraudes. Um sistema financeiro grandioso, mentiroso, que exibia opulência e que enriquecia parasitas e especuladores. O sistema bancário está a ruir. Mas durante anos, os mesmos bancos que agora trazem o mundo agitado, esses mesmos publicavam relatórios declarando lucros exorbitantes, escandalosos. Durante anos, os administradores, os gestores, os executivos desses mesmos bancos faziam-se pagar com ordenados milionários, principescos, escandalosos. Ordenados que ofendiam a pobreza. E aos abundantes vencimentos juntavam prémios de produção e de bom desempenho. Esses mesmos gestores classificavam seus empregados, a quem obrigavam a trabalhar horas extraordinárias sem a correspondente remuneração. Bancos que punham à venda o que chamavam produtos e diziam ser produtos com boa rentabilidade, criativos e inovadores. Agora sabemos o real valor desses produtos. Produtos que vendiam ao balcão a clientes e sobre os clientes faziam logo cair comissões de gestão, taxas e outros custos, que garantiam logo à cabeça os lucros para o banco. Bancos que se fazem pagar de todos os serviços que prestam, de todo o documento que passam, e tudo muito bem pago, agora declaram dificuldades e entram em falência. O dinheiro que circulava por esses bancos, pelas bolsas, pelos mercados financeiros nada tinha, nada tem a ver com a economia real. Bancos que investiam nas bolsas em operações de economia de casino, estão em falência. Bancos que marcavam forte presença nos mercados financeiros, estão em falência. Bancos que sempre se puseram acima dos governos, achando-se senhores do poder, estão em falência. Agora, esses mesmos bancos estão a ser bafejados pelos governos que os acodem com o dinheiro dos impostos pagos pelos cidadãos. O remédio que está a ser dado ao sistema financeiro em falência compensa as fraudes que os gestores fizeram. O dinheiro que está a ser injectado no sistema não deve, não deveria beneficiar os especuladores, mas logo que há notícias de possíveis injecções de dinheiro, logo dizem que os mercados financeiros animaram, o que significa que a especulação voltou à praça, está de volta. Esta crise veio mostrar que de nada valem os reguladores e os supervisores. Cargos de nomeação, tudo muito bem pago e com muitos consultores e assessores ao serviço. Mostraram-se inúteis, colaborantes com a especulação. Falharam os bancos centrais e os governadores de tão elevadas instituições que não viram, ou não quiseram ver as fraudes que cresciam e a futilidade dos produtos financeiros vendidos aos balcões de tão prestigiados bancos. Não havia, não há ética na economia. O mercado, o livre mercado, o Deus mercado falhou e está a arrastar as pessoas para dificuldades desesperantes e sem culpas no regabofe do mundo financeiro. Os gestores e os investidores tão acarinhados pelos governos têm de ser responsabilizados. Isto é fruto de um mundo sem valores. Um mundo governado por políticos que sobem na politica bajulando e acotovelando, anulando todos aqueles que se orientam na vida por valores, dando prioridade à dignidade, à justiça. Os políticos que abdicaram da dignidade vivem em função da sua carreira, da sua imagem, dos seus interesses. Nos palcos da política mundial exibem-se figuras preparadas e treinados nos gabinetes de imagem por técnicos de marketing. Fúteis e sem ética. O mundo, os economistas, os políticos precisam de ética. Precisam de moralidade. Os sistemas económicos precisam de valores.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Fr. JOÃO LEITE op - 9 de Outubro - Parabéns!

Ao enviar um abraço de parabéns, á minha memória surge uma série de agradáveis e saudáveis recordações: Professor exigente que preparava as suas aulas e criava o gosto pela leitura; empenhado treinador defutebol; percursor defensor dos direitos do consumidor ( a sua luta epistolar com o comerciante de artigos desportivos "que faria o Sr.Faria"), etc. Recordo as suas cartas-colectivas sobre a experiência e vivência de Capelão militar, em Moçambique. Votos de saúde e que encontre tempo e disposição para aparecer nos nossos (de todos) ENCONTROS.
Joaquim Moreno

CAROS AMIGOS:


Como diz o Toninho num comentário, nestes últimos meses tenho sido pouco assíduo ao blog. Poderia dar 10 ou mesmo 20 razões que justificariam, cada uma por si, esta minha ausência! Prefiro dizer simplesmente que não gosto de me forçar... e hoje apeteceu-me de:
- Agradecer ao Joaquim Moreno as palavras certinhas que ele escolheu para falar de mim e do meu aniversário. É verdade que o Fernando ou Rebelo em Aldeia Nova e o frei Lucas em Fátima, não tinha um carácter fácil. Era peneirento. Dava ares de pessoa importante, esquecendo-se que quem não tem pé não pode dar coice. Muitas vezes conseguia humilhar e rebaixar os colegas. Diz-se que presunção e água benta cada um toma a que quer... Ora esse fulaninho a água benta bem a viu, mas passou ao lado. A presunção caiu-lhe toda em cima. Ele era dos tais individuos com quem é melhor andar a bem que a mal. Tinham razão os que falavam ou pensavam assim!
Como é possível que com este carácter (que alguns chamam de personalidade) conseguisse guardar por tantos anos (aquí e aí) tantos e tão bons amigos!...
Só tenho uma explicação: os meus amigos são todos inteligentíssimos. Eles compreenderam que por tràs da máscara com que me protegía, ou por dentro da carapaça que me envolvia, escondia-se um ser sensível, respeitador e acolhedor, digno de amizade e de confiança. Obrigadissimo, meus amigos, pela vossa amizade. Obrigado a todos os que me saudastes no Blog, me telefonastes ou pensastes em mim. Foi um enorme prazer e continuarei a beber à vossa saúde, cuidando ao mesmo tempo da minha. O Eduardo bento convida-nos a irmos beber um copo (e mais se houver sede) à sua cave no dia 18 á noite. Eu não quero ser nem a causa nem a razão deste encontro. Aceito no entanto ser o pretexto (se é necessário um) para nos reunirmos e confraternizarmos. Para isso todos os pretextos são bons.
- Quero também pedir desculpa a todos os que nestes últimos meses festejaram mais um aniversário, e eu não os felicitei... estive presente pelo pensamento. Faço meus os comentários do Joaquim Moreno que pelos vistos se especializou no estudo da personalidade. Penso de novo e com grande amizade e simpatía no Pe Miguel, José do Espirito Santo, José Vieira, Eduardo Bento... Ao aniversário do Eduardo Bento associo sempre o Horácio que nasceu também no dia 11 de Setembro e já nos deixou há cinco meses...
Seguí com muito interesse as celebrações das bodas de oiro do frei João Domingos e também a intervenção do Frei Pedro. O nosso blog está aberto não só a todos os ex-Dominicanos mas mesmo aos que ainda professam na Ordem! Quantos mais largos são os horizontes, mais rica e luminosa é a nossa existência!...
- No que se refere aos anónimos estou absolutamente de acordo com tudo o que foi dito pelo nosso jurista Celestino, pelos homens de comunicação Nelson e o Eduardo Bento, e tantos outros. O Blog não perdará nem em diversidade nem em riqueza, visto que uma possibilidade de anonimáto é oferecida, àquele que deseje ficar na sombra. Basta que se identifique perante o Nelson, que se compromete a guardar o segredo. O desejo dos fundadores e de tantos outros que imediatamente aderiram a esta iniciativa, era manter laços, estreitar laços, criar laços. Trata-se de amizade, de convívio. Houve sempre um espirito de abertura aos mais velhos e aos mais novos e os apelos a mais participação foram numerosos e continuam.
Um abraço para todos e até ao dia 18 em Fátima.
Fernando Vaz.

domingo, 5 de outubro de 2008

FERNANDO JOSÉ VAZ -6 DE OUTUBRO- PARABÉNS!...

Será que neste dia de 68 outonos ainda canta ao desafio, com os netos ? Tinha resposta pronta e fácil. Ás vezes era "demolidor" nas respostas e criava anti-corpos. Sempre foi mais virado para as artes do intelecto=estudo do que as artes desportivas. Nas páginas deste "criar laços" existem referências e percurso de vida deste jovem-transmontano. Consta que é requintado no acolhimento-hospitaleiro, e bom "produtor" de compotas. Votos de muita saúde e bom aniversário na companhia da Geneviéve, Filhos, Netos e Irmãos.
Joaquim Moreno

DO EDITOR

Vários têm sido os companheiros e amigos, frequentadores e intervenientes no blog, que me têm contactado no sentido de ser vedada a entrada a "anónimos" ou a quem utilize pseudónimos sem prévia identificação perante o administrador do espaço. Não me tem sido fácil lidar com esta situação, mas tenho contemporizado já que o objectivo genético do "criar-laços" está muito para além das atitudes ditas de peixe de açude. E é por via disso que aqui venho, diariamente e mais que uma vez ao dia, para que se cumpra o desiderato de um punhado de ex-seminaristas dominicanos, por sinal entrados para A. Nova na década de 50: conhecermo-nos, reencontrarmo-nos e recuperarmos tanto do que deixámos para trás. E as portas do blog franquearam-se para todos, independentemente da época em que puseram o pé na casas dos dominicanos. E o blog tem, de alguma forma, cumprido os objectivos. Já houve reencontros, comunicamos e vamos sabendo por onde andamos. Muitos dos intervenientes deste espaço, são bem mais novos que eu, mas já trocámos mensagens e já somos amigos. E há os que não querem, ou não gostam entrar neste jogo, e por isso se refugiam no anonimato. Cada qual tem a sua razão. Cedendo a conselhos e alvitres de muitos companheiros, a partir de agora, cessaram as intervenções anónimas. E que esta posição não seja havida como um acto censório!... Nada disso! Quem, como eu, milita na comunicação social, abomina a censura e reprova qualquer tipo de intervenção anónima. No caso deste espaço, uma e outra serão inconcebíveis.
Solicito a compreensão de todos e jamais será recusada a publicação de um comentário devidamente identificado. Podereis ver os vossos comentários publicados com algum atraso, mas isso fica a dever-se ao facto de eu não estar permanentemente on-line.
Fica a minha disponibilidade e o meu abraço.
Nelson Veiga

OBRIGADO PE. ALBERTO VIEIRA

Naquele tempo, achou por bem, por razões que nessa altura desconhecia, o DIRECTOR chamar-me ao seu gabinete. Eles deviam saber todos…

Claro que por mais que queiramos esconder o nosso jardim secreto há sempre uma atitude ou outra que nos escapa para nos trair completamente, e assim aconteceu.
O coração nessa altura deveria bater umas boas por segundo antes de entrar, o pior de tudo é que fora chamado e não tinha a mínima ideia do porquê…deveria andar no ar alguma tramóia…mas o quê ?...
Em breve iria saber o porquê.
Abro a porta e deparo-me com um semblante airoso e sorridente de quem nos quer transmitir algo de extremamente importante. De surpresa em surpresa e sempre me questionando o que poderia ser, eis que ele me chama para junto de si pega em mim como numa pena e senta-me nos seus joelhos.
Franzino que era o Tonito atónito começa por imaginar mil e uma cena quotidiana desfilando e subitamente pega na Bíblia e pede-me para a abrir onde eu bem desejasse…aqui o grande mistério acaba por se revelar, quando ele me pede para ler o primeiro parágrafo. Senti delizar pelos seus joelhos, imaginei que era sonho, desejei uma brecha no solo e enfiar-me por ela a baixo, pela primeira vez imaginei o caos, o inerte, a inexistencia. Estava descoberto, tentei em vão escapar-me daquela provação ; era pior que chicotadas…, era preferível umas quantas bofetadas ou uma biqueira no trazeiro.
Sereno o amigo Alberto Vieira havia compreendido que tal sofrimento interior teria que ser posto à prova… eram os prenúncios de uma terapia …
As minhas lágrimas nada resolveram, a primeira tentativa de leitura falha e a cada palavra um bloqueio, um soluço e um gaguejar que nunca mais tinha fim.

Com imensa paciência tu me escutaste prescutando todo o meu íntimo atormentado e quantas vezes martirizado por colegas que não sabiam compreender, tu compreendeste que eu me fechava no silêncio para não ser alvo de chacota. Quantas vezes a resposta na ponta da língua ao ser questionado e para evitar risadas na sala, silenciava-me …

Tu me compreendeste outrora e eu nunca te agradeci, a título póstumo aqui vão os meus agradecimentos e que Deus te tenha no seu seio. Sei que sabes que singrei e venci.
OBRIGADO Padre Alberto Vieira.
O TREZE
António Lopes

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Por esta estrada - AO MESMO TEMPO A ESPERANÇA




Quando só o lucro interessa, a consciência humana tem de ficar
fora dos negócios para não ser visitada por nenhum anjo inquietante.
Frei Bento Domingues, Público de 28/09/2008



Talvez nem tudo seja assim tão mau. A actual crise financeira por que passa a humanidade, - segundo alguns comentadores, a pior de sempre, - poderá fazer nascer uma nova esperança para a humanidade. A lição que se pode retirar da presente situação pode ajudar a transformar a história dos homens numa caminhada mais justa e equilibrada. Poderá estar a aparecer no horizonte o anúncio de uma outra ordem mundial onde a trapaça financeira dê lugar à exigência ética como reguladora das relações entre os homens.
A economia mundial tem sido sustentada por um sistema financeiro especulativo, assente na procura do lucro a qualquer preço, alimentada pela ganância e pela rapina. Um sistema opressivo que tem impedido o desenvolvimento de Estados e de povos. Instituições que ainda na véspera apresentam os maiores lucros e premeiam os seus maus administradores com obscenos ordenados, entram em colapso e deixam no rasto da sua queda inquietação, pobreza e mais pobreza.
Agora pede-se aos Estados a quem se relegou para o simples papel de olheiros desinteressados, porque convinha a alguns, que intervenham, que policiem, que subsidiem. A crise assentou-se entre nós e, desgraçadamente, está à nossa mesa. Está nos salários em atraso, nas empresas que encerram, nos filhos sustentados pelos pais e com o diploma de doutor no bolso…
Duma santa aliança entre políticos e interesses financeiros nasceu este estado de coisas. Incentivou-se a iniciativa dos mais espertalhaços, promoveu-se o capital a ídolo global e o lucro como a suprema conquista da felicidade. É este mundo que agora treme na sua base; são estes os náufragos que pedem salvação quando, com a sua arrogância, nunca salvaram ninguém.
Mas desta crise que, com os seus estilhaços, atinge toda a gente, talvez nasça uma nova situação. A desorientação dos mercados financeiros, alimentados artificialmente pela especulação e pelo jogo da Bolsa, poderá levar à procura de caminhos alternativos. Poderemos estar perante o acordar da consciência colectiva que leve a humanidade a construir uma economia com base na justiça e na verdade e não fundada na ganância e no lucro.
O edifício desmorona-se e isso pode ser um sinal de esperança. Por onde andarão agora os teóricos do liberalismo e os gesticuladores que anunciaram o fim da história?


Eduardo Bento