quinta-feira, 21 de julho de 2011

IMELDO, PARA QUE A MEMÓRIA PERDURE



A pedido do Nelson aqui vão breves dados sobre o nosso colega Imeldo, que já partiu para os páramos eternos. Elogio fúnebre? Nem todas as páginas do Blog chegariam para os encómios que o Imeldo merece. Portanto sobre ele este epitáfio:
«Pchiu!». E basta.

E Bento


Pede-me, o Nelson, que faça o elogio fúnebre do Imeldo agora que soube do seu funesto passamento. Eu não diria elogio fúnebre, pois esta insigne figura, que combinava em si a agreste rudeza das fragas do Marão com o suave marulhar do rio Corgo era, de seu natural, discreto, humilde, um pouco tímido até. Por isso era avesso a elogios nem que fossem fúnebres. Por isso deixo aqui, quanto os dados de que disponho me permitem, um esboço biográfico deste homem que se manteve sempre fiel aos ideais de Deus, Pátria e Família.
Imeldo era o nome de cenóbio de Francisco Martins Pereira, filho natural de pai incógnito. E, vindo eu à fala acerca dele com o Toninho, este diz-me que ele o precedeu no chamamento do Senhor à vida monástica, quatro ou cinco anos.
Conheci o Imeldo quando, em 1975, estive empenhado nas campanhas de alfabetização que o MFA levou a cabo ali para os lados de Vila Real.
Numa das sessões o Francisco estava na primeira fila do salão paroquial da sua aldeia, Albadia, e não me passaram desapercebidos os calorosos aplausos que ele atribuía a um tenente que perorava sobre as vantagens do pêlo de cabra no resguardo dos frios de Inverno. Depois que os militares terminaram as brilhantes e úteis elucubrações, o Imeldo convidou-nos para a sua modesta mas bem recheada adega. E foi aqui que se deu o reconhecimento. Afinal, ele e eu, embora em tempos diferentes, tínhamos pisado aquele sagrado chão onde nos preparávamos para dilatar a fé.
Por algumas vezes mais nos encontrámos, o Imeldo e eu. E há tanto para dizer sobre ele que as duas páginas do Blog que o Nelson me dispensou, não chegariam para dizer do voo deste pássaro – deste pássaro? - desta águia que um dia pairou sobre as faldas do Marão e noutro breve dia desceu até aos rincões sagrados da serra d`Aire.
Direi, então, que este homem quis sempre que o mundo se mantivesse como esteve sempre. Candidatou-se duas vezes à Junta de Freguesia para lutar contra as modernices que querem tomar de assalto a alma do povo tão simples e tão bom. Infelizmente perdeu sempre as eleições que ninguém é profeta na sua terra. Ele queria fazer o que mais tarde Sócrates, sagazmente, veio a fazer: fechar a escola da sua aldeia porque, segundo ele, para ordenhar vacas não é preciso alfabeto. E diga-se, em abono da verdade, que ele viu, antes de tempo, agora o que todos sabemos: o conhecimento traz o atrevimento, o atrevimento traz o pecado.
O Imeldo foi um homem empenhado na conversão do seu povo. Defendia que se devia ouvir apenas a Rádio Renascença e dirigiu um grupo, Choral Adaequatio Intellectus, que só executava piedosas melodias e afins. E neste particular me confidenciou que muito lhe serviram os ensinamentos do Pe. Cerdeira – homem particularmente dotado no campo musical e em todas as artes melodiosas.
Enfim, não me devo alongar. Direi que o Imeldo morreu. Finou-se no verão passado em dia que não posso determinar, pois a seu respeito, Josefina, a sua única irmã me sonegou todos os dados e a mãe queimou os escritos dele, dizendo que não queria que a loucura alastrasse pelo mundo.
Dele, a única fotografia que tirei foi uma vez que, com o Moreno e o Brízido, nos encontrámos em Vila Real. Mas um e outro dizem-me que não sabem onde têm essa fotografia – eu direi, antes, que eles não querem publicitar o que religiosamente guardam para si.
Imeldo, homem ímpar, que soubeste remar contra o tempo, que o silêncio guarde a tua memória para que os sons que passam não conspurquem e estilhacem uma obra tão notável que de si não deixou qualquer rasto.
Eduardo Bento


9 comentários:

Anónimo disse...

É sempre um grande prazer ler-te!Realmente este nosso amigo possue um verdadeiro dom para a escritura, de todos os géneros e feitios:poemas,crónicas, editoriais... Quando a tua assinatura aparece, o blog fica mais rico e atraente.O Edoardo Bento escreve com a mesma facilidade com que respira. Tenho a certeza que, se lhe pedissem, escreveria uma óptima crónica em memória do leitão que comemos na sua adega no ano passado... Um abraço, Fernando

Jaime disse...

O passamento do Imeldo essá cheio de omissões, distorções e meios-ditos. É lícito pensar que alguém nos que fazer acreditar que o dito se finou mesmo e não me admiraria vê-lo reaparecer de novo ainda antes da ressurreição dos mortos, talvez saído da tal fotografia que desapareceu ou não.
Personagem de quem não gostava particularmente, sinto agora a sua falta. Ele fazia vir a terreiro, brandindo o castigado verbo, o frei Vintém e outros que polemizavam e enchiam de vida o blogue.
Um abraço
Jaime

nelson disse...

Concordo em absoluto com o Jaime e permitia-me perguntar ao Eduardo se tem, ou alguma vez teve, novas do Ezequiel Vintém?!... É que eu, aqui na Beira Alta, pouco ou nada sei. Quase tudo me passa ao lado, só a Linha Férrea da Beira Alta é que passa no meu quintal. E agora com praia artificial por perto, já nem me puxa para ir até ao litoral!...
Abraços.
Nelson

Anónimo disse...

Vim por acaso ao blogue, e fiquei estarrecido com duas coisas: a primeira com o conjunto de virtudes deste Imeldo; a segunda com o meu desconhecimento sobre a existência deste poço de virtudes. Certamente por falta de alguns atributos espirituais, tudo me passou ao lado. Não sou um previlegiado como como o Bento, o Toninho, o Moreno e o Brízido que tiverm o previlégio de conheceram pessoalmente tal embaixador de Deus. Certamente que ele na terra só se manifestou aos portadores da graça de Deus, escondendo-se dos demais, pecadores como eu. Mas já agora pergunto Eduardo, porque não aproveitas o instinto associativo, nado e morto de outrora, e não fazes uma "fundação" ou coisa parecida, para dares continuidade aos ideais do Padre Rolo e te dedicares à causa da canonização deste Imeldo, promovendo a divulgação das suas virtudes. Eu não conheci o Frei Bartolomeu do Mártires. Mas, pelo que vi agora no Blogue, o grande Imeldo ... não lhe fica atrás. E além disso, fica mal a um cristão tão virtuoso como tu deixar este exemplo de virtudes no caixote do esquecimento da generalidade dos menos bafejados pela graça de Deus. Segue os conselhos deste pecador. Põe mãos à obra, porque eu estarei atento, e, logo que aconteça algum milagre, atribuido a este santo Imeldo, comunicá-lo-ei de imediato para que o faças também de imediato chegar a Roma, antes que as portagens cheguem às scut's.Fica mais barato.
Um abraço
J.Vieira

Anónimo disse...

4COMENTÁRIOS

Ao Fernando: Dizem-me que dentro de poucos dias visitarás Portugal. Então o melhor discurso sobre o leitão será, em Torres Novas, um novo leitão.

Ao Jaime: É claro que em toda a biografia há omissões e lacunas. E no caso presente, falando do Imeldo, escasseiam dados que nos permitam um retrato mais completo desse antigo colega. Diz-me o Brízido que levará para o rpóximo encontro a foto do Imeldo.
Do Vintém nada sei, parece ter emudecido depois da morte do Imeldo com quem mantinha no Blog infindáveis discussões. Mas partilho da ideia do Antero, polémicas que nada esclarecem não fazem aqui falta.

Ao Nelson: Já disse que do Vintém nada sei. E tu tem cuidado com essa praia artificial pois todo o país está todo ele artificial.

Ao Vieira:
Como diria o Frei Pio, a tua consciência é como um arbusto, passa um burro e come-a. Tu parece que estás a bricar com coisas sérias. Falas do Imeldo com pouco respeito, ele merece o respeito de todos nós como exemplo de vida. E de Santidade não deves falar pois tu, com a tua impiedade, desististe de ser santo.

Para todos um grande abraço.

Eduardo Bento

Anónimo disse...

Eduardo Bento,
Longe de mim brincar com coisas tão sérias como a santidade do Imeldo da qual, aliás não duvido. Basta-me a fonte donde provém a notícia da mesma. Aliás, interpreto a tua resposta à minha sugestão como um desejo teu de trabalhares discretamnte numa causa tão nobre. Darás seguimento a esse nobre inspirador, Padre Rolo, embora para santo diferente.
Por mim, vou deixar-te trabalhar, porque a causa é justa e nobre. Se precisares de ajuda é só dizer. Mas embora a causa seja nobre, não exageres, porque, como ainda estou no activo e sou pecador, ainda vou tendo uns assuntos terrenos para resolver.
Um abraço
J. Vieira

Antero disse...

A minha homenagem ao Imeldo, foi a leitura dos seus textos.
Associo-me às ideias piedosas e brilhantes dos que me anteceden nestes comentários e espero que o Eduardo Bento, nos indique ao menos onde foi parar o brilhante epitáfio, pois as cerimónias foram muito secretas e pouco democráticas.
Um abraço.

Antero disse...

A minha homenagem ao Imeldo, foi a leitura dos seus textos.
Associo-me às ideias piedosas e brilhantes dos que me anteceden nestes comentários e espero que o Eduardo Bento, nos indique ao menos onde foi parar o brilhante epitáfio, pois as cerimónias foram muito secretas e pouco democráticas.
Um abraço.

Anónimo disse...

Antero:
Realmente, pelos escritos do Imeldo podemos todos seconhecer, se não o brilhantismo literário - ele, como diz o Jaime, era um cultor gongórico do verbo castigado - pelo menos o seu ardente misticismo que está na confluência do frenesi báquico com os arroubados êxtases teresianos. (O Abel Pena não desdenha apontar o pathos trágico como força catapultadora daquela alma quando se tratava de defender a subjugação do profano ao sagrado, dos fulgores da razão à imarcescível luz da fé). Talvez, amigo Antero, eu não tenha sido claro quando me refiro ao epitáfio do Imeldo. Não é epitáfio escrito na pedra,nem no cimento, quiçá na areia ou no vento. Porque, não devemos escrever ou dizer quando estamos perante o puro assombro mas gurardar-nos no silêncio que nos confronta com os nossos limites, a nossa finitude. E tu, Antero, ainda te recordas quando há tempos, em Trancoso, teu pátrio ninho, me falavas da necessidade de não deixar cair no esquecimento o profeta Bandarra e o prolífero Pe Costa, teus conterrâneos? Pois também eu aponto a todos nós essa figura exemplar que foi, é e será o Imeldo, com epitáfio ou sem epitáfio.
Um abraço do Eduardo Bento