segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

REFLEXÕES (INOPORTUNAS) SOBRE O TEMPO DE NATAL

Exausta fujo às arenas do puro intolerável
Os deuses da destruição sentaram-se ao meu lado
Sophia de Mello Breyner

É tempo de Natal.
Não trago hoje, para aqui, lamentosos tons sobre este tempo de consumismo e de ansiedade deslumbrada, que enfernizam a vida. Nem sequer falo do espírito de fraternal alegria que se foi perdendo e que esta Quadra nos trazia desde o mais fundo dos tempos. Nem direi do pai natal, essa figura alarve, que enche todos os anúncios com o seu barrete, as suas barbas, o seu fato encarniçado de publicitário.
Interrogo-me sobre a intolerável capitulação da nossa civilização perante o Nada, alienada, tomada de assalto pelo superficial.
Li há dias que numa escola de Inglaterra não se iria festejar o Natal para não ferir a susceptibilidade dos alunos de outras religiões. Se eu não soubesse que estava a viver neste tempo vazio, sem pontos de referência, ficaria embasbacado, e deixaria que o espanto me abocanhasse. Mas não. Este tempo está entregue ao triunfo triste do relativismo, à debandada da nossa civilização. Este tempo é propício à morte de todos os sonhos.
Como que temos vergonha, em nome do pluralismo cultural, daquilo que nos caracteriza e faz parte da nossa história. Estamos a ser expulsos da nossa própria casa, invadidos pela nossa estupidez.
Chegaremos ao ponto de recusar o domingo como dia de descanso porque isso é de origem cristã e poderemos estar a ofender pessoas de outras religiões que vivem entre nós. Chegaremos a apagar Afonso Henriques da nossa história, mau exemplo de intolerância para com os Mouros; tiraremos dos manuais escolares D. Afonso V, o «africano», em nome do multiculturalismo…
E a narrativa da batalha de Aljubarrota, por exigência da fraternidade ibérica passará ser assim: «E havendo encontro marcado entre portugueses e espanhóis, ali para os lados do mosteiro da Batalha, com muitos tambores, trombetas, pandeiretas, gaitas de foles e relinchos de cavalos, qualquer coisa correu mal. Nisto, os espanhóis começaram a sair com muita pressa e foram-se asinha sem se despedirem. Cinco deles ficaram para trás tendo sido encontrados por uma padeira que, com muita bondade e caridade, deu um pão a cada um e ainda lhes pagou o bilhete para Badajoz».
Triste tempo, este meu tempo. É nesta ideologia do vazio que vão apostando todos os demagogos que nos vão tratando da saúde. Com o nosso voto.


Eduardo Bento

10 comentários:

Armando disse...

Bela reflexão, na senda do que o Eduardo nos tens habituado. Fez-me evocar a história da rã da autoria de Olivier Clerc. Nadava a rã numa panela que entretanto alguém pôs ao lume. Com a água morna a rã ficou mais confortável. Ainda lhe foi agradando um pouco mais quente. Quando o calor já a incomodava achou que não valia a pena estar reclamar por isso. Em determinada altura do aquecimento da água a rã perdeu as forças e então quando quis fugir de ser cozida já não conseguiu. Se a rã tivesse sido introduzida na água a 50 graus ela teria dado a sapatada e escapado. Assim, através dum aquecimento lento e enganador acabou por ser cozida sem uma reclamação. Será que já estamos meio cozidos?
Boas Festas a todos.
A. Alexandrino

Jaime disse...

"A caridade bem ordenada começa por nós mesmos". Não sei se é uma frase bíblica e seria de S.Paulo, se um simples dito popular. Mas veio-me ao pensamento, ao ler o Eduardo e o Alexandrino, sob a forma de paráfrase, nestes termos: o respeito pelo outro assenta no repeito que temos por nós próprios.
E pelas nossas coisas.
Graças a quem no Natal nos vem lembrar a importância das origens e os pressupostos da nossa identidade.
Aproveito este meio para desejar a todos, BOAS FESTAS!
Jaime

Anónimo disse...

Como sempre, este texto do amigo Eduardo Bento, merece ser refletido e aprofundado. Concordo com a alegoria do Alexandrino e o comentário do Jaime.
Quando a cruz vermelha fracesa se deslocou para socorrer as vítimas da guerra do Golfo, foi obrigada a suprmir todas as cruzes dos seus veículos. Os membros femeninos tiveram que submeter-se à moda vestimental, etc. Onde está a reciprocidade? Em nome da liberdade, do respeito, da tolerância, da democracía, estamos a perder a propria alma. A não ser que seja por medo de sermos tratados de reacionários ou de racistas... Quando os outros nos aceitarem tal como somos, então, mas só então, é que podemos e devemos aceitá-los tal como eles são!... Parece que andamos sempre a pedir desculpa por não sermos judeus, por não sermos pretos ou árabes, por não sermos pédés... Finalmente estamos realmente a abandonar cultura, religião, civilização... ou vivemos num “tempo vazio”... Bem sabemos que a natureza tem horror do vazio... Para não sermos expulsos de nossas proprias casas, sejamos nós mesmos, sejamos autênticos, e que a nossa identidade nos venha da nossa vivência no quotidiano e não só dos manuais de história. Fernando.

Anónimo disse...

Não conheço pessoalmente, penso eu, muitos dos intervenientes deste blog, nomeadamente o autor e os comentadores deste interessante texto. Mas benficio à mesma das pérolas que por aqui vão espalhando. E neste texto, como dizia um amigo meu, parafraseando o seu avô, "quando se deu a batalha de Alcácer Quibir, todos os nobres e homens bons , sadios, inventivos, arrojados e com ânimo mais forte, seguiram o Rei D. Sebastião numa missão que resultou muito mal pois por lá ficaram quase todos... Os que ficaram em Portugal eram essencialmente os coxos, marrecos, adoentados e fracos do físico e da ideia! É desses que descendemos! E dizem que até já melhorámos muito, face à nossa origem! "
Deixando de parte a ironia, porque "cozidos" ( nem sei se será este o termo mais ajustado) vamos sendo, ao entrarmos na globalização por suposto interesse e unica viabilidade política de "futuro" e vamos saindo depenados, dos nossos princípios, da nossa identidade, etc. Está a acontecer-nos o mesmo que ao Charlot-operário, pois já começamos a ter tiques.
Uma reflexão bem profunda e oportuna. Muito interessantes os comentários de companheiros de percurso que também apreciei.

Anónimo disse...

De facto, o Eduardo Bento que já nos brindou com certas irreverências e extremismos,que não ficam bem a quem já andou por caminhos de fé, desta vez deu-nos um interessante texto com fina ironia, em defesa dos valores nacionais.
Ainda ontem,por telefone, manifestei ao Nelson o meu desencanto por não ver no Blog coisas concernentes à nossa religião católica. Penso que a maior parte de nós sentirá isso.
Mas, nestes tempos, estaremos a ir contra a maré...enfim.
António da Purificação

Anónimo disse...

Eu já nem diria tanto, caro António!
Daria de barato que não falassem de religião. Mas esperaria que se insurgissem contra os pessimismos de quadrantes opostos que por aqui florescem, como é o caso deste E. Bento. Sabes o que me parece? Com desgosto o digo. Tenho a sensação que mesmo antes da "crise financeira e económica" já atingimos a "bancarrota moral", quando vejo utilizarem-se termos como "cozidos" com duplo sentido.
Que ao menos se salve a decência.
Ezequiel Vintém

Anónimo disse...

Finalmente, nós os decentes, começamos a não ter medo de aparecer no blog. Força Vintém!
Seremos a reserva moral... Mas agora começo a tomar tento... Não estarás a mangar comigo? É que eu parece-me estar a recordar de intervenções tuas de sentido contrário.
António da Purificação

Anónimo disse...

É natural que tenha amolecido um pouco nesta época. Sabes como é o espírito natalício acaba por entrar em nós. Talvez tenha ficado um pouco piegas. Mas não me leves a mal. Por favor não faças como um tal Imeldo que me deixou sem saco de serreadura. E sem saco de serradura como é que treino a agressividade? Não posso viver sem beatos, tal como o Obélix não pode vcicer sem romanos. Por Toutatis, não me abandones.
Ezequiel Vintém

Anónimo disse...

António da Purificação e Ezequiel Vintém, que a Paz esteja convosco! E comigo também!

De facto este blog deve ser feito para leitura de toda a gente. Quando uma alma piedosa, e sempre pronta a espalhar aqui e ali os bons conselhos e a propagação dos elevados e insondáveis desígnios do Bem, como é o caso do António da Purificação, clama, com o apoio do Ezequiel Vintèm, e vice-versa, quanto ao duplo sentido, não mais se pode negar a existência do duplo sentido.
Há coisas do Diabo...
O autor do clarividente texto logo no seu título o chamava, com duplo sentido, de "Reflexões (inoportunas)..." quando se está mesmo a ver que parecem mesmo oportunas e aprofundadas!
Depois veio o Alexandrimo com a magnífica história ou parábola da rã...e as demais afirmações dos restantes amigos Jaime e Fernando, todas interessantes e profundas, que bem podiam ser objecto de um tratado de mil e um sentidos!
Logo sobrou para mim uma afirmação de duplo sentido:
A verdade é que, com o duplo sentido, sempre em Aldeia Nova me atacaram frequentemente: Quando eu dizia que era de Meda (leia-se Mêda). Até uma estátua de um "Rê" inauguravam no meio da vila. " Grande Meda!", ouvi eu muita vez, principalmente do António Valente. E percebi depressa que não tinha a ver com os excelentes vinhos, azeite, figos, amêndoas, castanhas e outras colheitas notáveis do concelho! Era um duplo sentido. Compreendi pois a mensagem dos piedosos companheiros Ezequiel e António da Purificação.
Mas tudo se deve seguramente a uma falha na formação dos alunos de Aldeia Nova, pois de culinária nenhuns conhecimentos nos ministraram! De facto, entendi eu, no contexto, que o termo "cozidos" não seria o mais ajustado, pois a parábola do Alexandrino invocava panela, uma rã, em água, que alguém levou ao lume, e no caldeirão da globalização nós ( sem água, nem lume) dificilmente seríamos cozidos. Mas também não me pareceu adequado utilizar outro qualquer termo, por exemplo: estufados, escalfados ou mesmo fritos!
De todo o modo, porque percebi que a vossa pura mente imaginou, se calhar bem, termos inomináveis, deveriam cumprir ambos penitência por pensamentos não "decentes", mas nada de avé marias, pois ficariam certamente muito constrangidos se tivessem que justificar junto da Mãe do Céu o porquê do tributo que estavam a prestar.

Caros amigos, fora de ironia, aqui fica a promessa ( também ao Nelson )de que no futuro terei mais cuidado com os duplos sentidos, pois apesar de este ser um blog de antigos alunos( todos maiores), pode e deve ser adequado a pais, filhos e netos.
Que assim seja!
Antero Monteiro

Anónimo disse...

Cumprimento o bom companheiro Monteiro que não conheço, mas vejo que é homem sensato e de reflexão. Não me escandaliza um termo ou outro adequadamente mais provocante. E, ai de nós se não sabemos suportar um plebeísmo. Por isso, amigo Antero, não lhe doa a mão e use a lingagem do nosso povo. O que se passa aqui,julgo que o amigo ainda não se apercebeu, é uma guerra surda entre mim e um tal Vintém ( julgo que nunca andou pelos nossos terrenos mas é um infiltrado) que não se cansa de me provocar sobretudo em questões de religião.
António da Purificação