“ O que agrada na beleza não é o objecto mas a apreensão do objecto”
S. Tomás d’Aquino
Olhar de peregrino ou leitura teológico-pastoral dos principais componentes da igreja da Santíssima Trindade do santuário de Fátima ( Ver Apocalipse, 21, 12-14 )
Estamos perante um templo em forma circular – a perfeição das formas geométricas – evocadora da perfeição máxima: Deus/Trindade.
Os elementos que habitam o seu interior respondem de modo feliz àquela finalidade intuída pelos artistas que lhe emprestaram o seu génio. Nesta viagem de peregrino vamos descobrir a sua riqueza.
O painel do fundo em material nobre exprime a beleza da Jerusalém Celeste, outro jeito de dizer Igreja Triunfante. ( cf. Ap. 21, 2-3 ). Para cada um de nós há aí um lugar. A essa magnifica assembleia preside o Cordeiro ( Ap. 21, 22-23 ) na zona central,
“ a Ele louvor e glória pelos séculos… ( cf. Ap. 7, 9-12 ).
Figurações humanas aparecem com identidade reconhecida ou não… A construção da cidade não está acabada…Brilhantes são as peças banhadas pelo tom pascal ( o ouro ) que se movimentam para terem lugar neste majestoso puzzle.
Portais solenes vão acolhendo “as pedras vivas do templo do Senhor…” que passando pelo altar, onde o Cordeiro imolado é fonte de santificação universal, atingem o brilho pascal prontos a tomar o seu lugar da eterna aclamação a Deus e ao Cordeiro. (AP. 7, 9-10).
Sim, essas “pedra vivas” somos todos nós que estando do lado de cá na assembleia crente ainda não libertos da lei da morte mas militantes firmes na Esperança da Vida, com lugar certo na zona Triunfante desta Igreja, graças ao Filho morto e ressuscitado – o Cordeiro imolado!
O altar do sacrifício, de onde jorra essa vida, está diante de nós e é a ponte que dá passagem para o outro lado: “novos céus e nova terra”.
Entretanto, majestoso, está sobre o altar o Cristo crucificado, imponente, grande como o mundo do sofrimento. O seu olhar inquieta, não acusa. Interroga: “Porque me fizeste isto? Que mal te fiz eu?”
Quem é este Cristo? É Aquele que “ está em agonia até ao fim dos tempos”, na expressão de Paul Claudel.
Esse Cristo é toda a humanidade que sofre. Lá estamos nós mas, mais ainda as vítimas de gritantes atropelos, de todo o tipo de opressão e de injúria, (contra a dignidade humana), consentidos por nós. Sofrimento que a cada momento as nossas injustiças geram. Esta noite, dezenas de milhares de irmãos morreram de fome no mundo e não havia necessidade.
Este Cristo traduz de modo feliz todo esse tipo de sofrimento. Nele somos nós e os nossos irmãos que sofrem a dolorosa paixão que fabricamos e de que somos vítimas. Esse Cristo que tem a marca do Filho olha-nos de frente! O seu olhar perturba-nos: “Que mal te fiz eu para me pregares numa cruz?...” è essa a imagem que nos é dado contemplar. Não a de Jesus de Nazaré que gostávamos de ver… Não! Esse esteve três ou quatro horas na cruz e foi sepultado como diz o Credo. E diz também: ressuscitou ao 3º dia. Não está mais na cruz. “Porque procurais entre os mortos aquele que está vivo…vai à vossa frente. A morte não tem poder sobre Ele. Nunca mais o podemos contemplar na cruz!
A imagem de Cristo, no exterior do templo, na imponência da Cruz Alta, bem pode ilustrar a passagem de Isaías, cap. 52: “ de tal modo estava desfigurado que já nem tinha feições de homem, mais parecia um verme… os que passavam desviavam a cara, tal o aspecto do seu rosto…”
A Virgem do Rosário, no interior, é um encanto de beleza, delicadeza e alegria em crescendo…
Possa esta reflexão de peregrino ajudar a olhar, com olhos novos, para este majestoso e maravilhoso templo. Muito mais há nele a descobrir..
Assim se torne, como o Templo de todos os tempos, proclamação viva da palavra de Deus, lugar de acolhimento para todos os que o procuram.
Fátima,21 de Dezembro, 2007
Frei Marcos Vilar o. p.