Passaram cinquenta
anos sobre a ordenação sacerdotal do Fr. Pedro da Cruz Fernandes. Desperto para
esta realidade, dei comigo a desfiar um rosário de recordações, a recuar a um qualquer
dia do mês de Outubro de 1955 e a desafiar a memória que, felizmente, ainda me
assiste.
Tão menino que
menino eu era (ao jeito de Pessoa), menino de minha mãe 11 anos apenas, uma
camioneta ruidosa e poeirenta despeja-me junto à estação de caminho de ferro de
Vila Franca das Naves (Trancoso). Eu ainda não tinha forças para carregar as duas
malas do enxoval mas, como ia confiado à custódia de meu primo Álvaro Milagre
que ia para o 4º ano, era ele o meu suporte. Era cedo, sete da manhã, os
ferroviários de serviço ainda carregavam o peso do sono e da impertinência e
venderam os bilhetes para Caxarias. Um silvo distante, talvez na curva da
Velosa, anunciava a proximidade do trem. O cais era uma miscelânea de malas,
sacos de trapos e batatas, caixotes, cestos, adeus até pró ano, lágrimas,
suspiros e os ciganos que iam até à feira de Celorico. Suada e negra, a bufar
por todas as juntas, vinha a vaporosa locomotiva, arrastando consigo meia de dúzia
de carruagens classificadas de 1ª, 2ª e 3ª classe. Um seminarista era um
cidadão de terceira, ou não aspirasse, a partir daquele momento, às juras de
votos de pobreza. Das janelas de uma das carruagens, vozes gritavam: -Para aqui!...
José Lourenço, Zé da Cruz (fr. Pedro), Amadeu
Valério, António Lines, Manuel Melro, Orlindo Igreja, Manuel Salvado, Manuel Braz,
pelo menos a estes, juntei-me eu, meu primo Milagre e Francisco Saraiva.
Começaram a fazer-se as apresentações, partilhámos o farnel, as venturas, desventuras
e histórias do seminário. O Zé da Cruz já liderava de certo modo, embora não
fosse o mais velho do grupo. A sua amizade e sua disponibilidade para comigo,
eu nunca esqueci. Ensinou-me a fazer a cama no dormitório velho e até me
ensinou a cortar cabelo. De seu irmão, Fr. João Domingos, guardo uma saudade
imensa, que mitigo de vez quando lendo uma carta que religiosamente conservo e que
ele me escreveu quando lhe comuniquei que não me apresentaria no Convento de
Fátima para tomar hábito, no dia 4 de Agosto de 1960.
Idealizei
a minha presença nas comemorações do jubileu de ouro na sua aldeia natal –
Torre (Sabugal). Porém, nem sempre o que calendarizamos acontece e eu não
poderei estar presente. Ele sabe, contudo, que eu estarei em espírito
comungando da acção de graças que ali terá lugar.
Obrigado
fr. Pedro por esta amizade (já tão velha!) e que Deus te deixe permanecer muito
tempo entre nós.
Abraço
Amigo
Nelson
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