"Interrupções voluntárias da gravidez estão a aumentar em Portugal", título de um artigo no jornal Público (também está noutros diários) via Agência Lusa de 15.06.09. Mas tal parece ser apenas nos três hospitais/clínicas de Lisboa abordados, pois carece de dados para o resto do território nacional.
Reparemos como começa o desenvolvimento da notícia:
«O número de Interrupções Voluntárias da Gravidez (IVG) aumentou em Portugal desde o início do ano, um crescimento que pode estar associado à crise económica e aos receios do seu impacto no aumento da família, segundo alguns responsáveis clínicos.»
E como acaba:
«A Lusa tentou saber junto da Direcção-Geral de Saúde (DGS) os números de IVG realizadas a nível nacional, mas este organismo do Ministério da Saúde remeteu para finais de Julho um balanço.»
Mas que raio de jornalismo é este?
A notícia anterior confronta com a seguinte, ouvida na TSF:
“A Associação para o Planeamento de Família entende que são agora poucas as mulheres que recorrem ao aborto clandestino. Elisabete Souto, da linha de aconselhamento da associação, diz no entanto que há muitas mulheres que desconhecem o conteúdo da actual lei.
A Associação para o Planeamento da Família acredita que serão poucas as mulheres que estão a recorrer ao aborto ilegal, isto numa altura em que passaram dois anos sobre a regulamentação da lei da Interrupção Voluntária da Gravidez.” (Notícia TSF de 22.06.09).
A meu ver, a “crise financeira”, influenciará os negócios, terá implicações no nível de vida dos mais pobres e dos desempregados, mas não tem qualquer efeito directo nos sentimentos, nas atitudes e nos valores éticos das pessoas.
Em Àfrica ou no Terceiro Mundo em geral, onde as dificuldades económicas são seculares e o termo “crise económica” será um eufemismo que não percebem, o volume de nascimentos não esmorece pela míngua de progresso económico; no Portugal dos nossos pais e avós essa relação nunca foi equacionada. Mesmo nos períodos difíceis como as guerras mundiais, a questão nunca era como evitar que surgisse mais uma boca para comer, mas que trabalhos e sacrifícios fazer para que nada faltasse ao novo ser.
Não vamos então admitir que nos países ricos ou em vias de desenvolvimento, as questões se ponham ao nível da escolha entre as férias nas Caraíbas, a lipoaspiração, ou a compra do automóvel e o nascimento de um filho.
Teríamos então chegado ao mais estéril campo de sentimentos humanos e da perda de afectividade, para não falar do atropelo dos valores que derivam da civilização de que nos arrogamos ou dos valores cristãos com tradição multimilenária entre nós.
A. Alexandrino
6 comentários:
Caro Alexandrino,
Vão longe os tempo em que havia espaço para todos, nem que "dormissem uns para os pés outros para a cabeceira".
Primeiro foi a revolução industrial,que trouxe quase toda a gente para as cercanias das grandes cidades onde se situavam os grandes complexos industriais (quantas vezes em "bairros da lata") para ter um salário grantido.
Agora estamos na era dos avanços tecnológicos.
Há pouco mais de trinta anos, vi claramente os tempos que se avizinhavam, quando tomei conhecimento de um projecto fabril que substituia uma fábrica que laborava com cerca de 100 pessoas (na actividade de cerâmica) por cerca de 14 ou quinze, com a vantagem de produzir o triplo.
Com esta evolução facilmente se concluía que o avanço tecnológico há-de deixar, a prazo, uma grande parte das pessoas dependente do Orçamento Geral do Estado.
Aumentará exponencialmente a mão- de-obra, que embaratecerá na mesma proporção...
Com um curso superior,não raramente, um jovem recebe seiscentos ou setecentos euros ... a recibo verde.
Os infantários e creches foram extintos em quase todas as fábricas e empregos, enquanto o Estado continua a não dispor de capacidade de resposta para os recém nascidos até à idade escolar... nem para os idosos! É preciso pagar amas ou infantários, como têm de se pagar casas de repouso ou os curadores de idosos.
A cidade não conhece a solidariedade da aldeia ou do meio pequeno...etc..etc..
Como arriscar o início de carreira-emprego, ou sequer a expectativa da mesma, ambicionando a independência económica, a casita, o carro, os pequenos confortos que a publicidade nos torna necessários ou indispensáveis?
De facto não se trata quase de opção mas de primeira necessidade.
A equação da vida faz-se cada vez mais pela economia de primeira necessidade de meios, pela sobrevivêncoa condigna, do que pela vertente dos valores, os sentimentos, a ética. O individualismo conjugado com o mercado. A família está em crise.
A educação está em crise nas suas quatro vertentes do Estado Novo, mas que foram estruturantes, quase sem nos apercebermos disso:
Começava a educação na família, continuava na Igreja, seguia na tropa e no emprego que ainda chegava a todos(melhor ou pior).
Todos estes "pilaretes" estão em crise ou sem a coesão necessária.
Mais IVGs? Claro! Inevitável...
Terrível, a longo prazo, mas inevitável... E penso que quando acabar a geração dos actuais avós a coisa piora mais ainda...
Meu caro, foste buscar um tema sem fundo e arrasador.
Um abraço.
Antero Monteiro
Andava com umas ideias na cabeça para apresentar um pequeno comentário ao texto do Alexandrino que é profundo e dá para reflectir, como de costume. Ao vir ao blog para redigí-lo, deparei com a reflexão do Antero que muito apreciei. Para não ser ridiculo impus-me mais umas horas de introspecção. Prometo que comentarei! Um abraço, Fernando.
A propósito de «O Tempore! O Mores!», dizia-se em Aldeia Nova que um de nós terá feito a seginte tradução: O tempo das amoras...
Hoje, admito que uma certa juventude desconheça tais saborosos frutos silvestres...
Habituaram-e à fruta frigorificada...
Claro que o tema de fundo suscitado pelo Alexandrino, não está directamente ligado à fruta...
O que está em causa não é propriamemete uma crise económica, mas uma crise de valores humanos, com consequências pouco animadoras...
Haja Deus...
Abraço amigo
Zé Celestino
PS - Dado que durante a próxima semana andarei( em serviço... ) por terras de Minas Gerais/Novo Horizonte/Brasil, espero, quando regressado, encontrar muitas intervenções e comentários dos nossos ilustres bloguistas, se possível com «caras» novas...
"Ferraz disse...
http://criarlacos-ex-dominicanos.blogspot.com/2008/01/o-tempore-o-mores-tempo-das-amoras.html
Aceitemos os sinais dos tempos, que nunca param por mais travões que lhes queiramos pôr. Presumo que, quando Cícero produziu tal exclamação do alto da sua tribuna, já teria uma idadezinha, talvez mais idade até do que a do sr. bispo auxiliar de Lisboa. São os conflitos de gerações: temos sempre receio das modernices e, no entanto, são estas que se impõem mais tarde ou mais cedo. É recorrente a posição da igreja oficial, ainda que o faça a título pessoal: os melhores valores são os antigos; o resto é dissolução, o caos; a culpa têm-na os Estados, facilitadores da dissolução, por não se assumirem devidamente reguladores dos actos dos cidadãos, deitando mão, imagino eu, aos corpos policiais e militares que possui.
Maldita democracia, esta que acredita na liberdade e na consciência das pessoas!...
Um abraço.
M Ferraz Faria
3 de Fevereiro de 2008 15:38"
“O declínio dos valores éticos pode levar ao colapso das leis do mercado", escreveu em 1985 o então cardel Ratzinger, no texto "Economia de Mercado e Ética”. Com base nestas palavras o ministro das Finanças italiano, Giulio Tremonti, afirmou que o Papa foi o primeiro a prever a actual crise financeira.
Afinal os deveres éticos precedem em importância as finanças e a economia, contrariando a moda dos economistas, e fazedores de opinião.
A. Alexandrino
Os habitantes da ilha da Páscoa desapareceram..talvez porque não fizeram contas aos magros recursos económicos que os sustentavam..Os esquimós praticavam o infanticidio quando não tinham recursos para cuidar das crianças..nas alturas do Tibete a poliandria prolifera como sistema de familia (uma mulher pode ter vários homens ..reduzindo as possibilidades de procriação da opção oposta )..O mundo tem 6 biliões de habitantes mas dizem os especialistas que 2010 vai ser o ano do pico petrolifero e a partir dai é a queda do petróleo , mas um mundo sem petróleo não tem capacidade para alimentar senão 2 biliões de habitantes..estaremos nós quase todos condenados como os habitantes da Ilha de Páscoa ?
José Carlos Amado
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