quarta-feira, 18 de dezembro de 2024

 

PINHEIROS, OLIVEIRAS E CASTANHEIROS

Com o ponto de situação que ora aqui faço, encerro este ciclo de um livro que procurou fazer o retrato possível das gerações que passaram pelo Seminário de Aldeia Nova no decurso dos seus trinta anos de existência (1943-1973).

Como a maioria saberá, houve dois momentos para a sua apresentação – uma, de caráter interno - no encontro anual em 5 de Outubro, outra -de caráter externo - em 16 de Novembro.

Tendo este livro tido uma tiragem de 200 exemplares é com alegria que informo que o mesmo se esgotou.

Tenho, por isso, alguns pedidos que não pude satisfazer e que ficaram em espera, aproveitando para pedir a eventuais interessados na sua aquisição que me contactem diretamente por forma a que, quando tiver um número mínimo de encomendas, possa abalançar-me numa reedição, ainda que bastante limitada.

Para além  das muitas e efusivas reações de companheiros – o que me deixou naturalmente feliz e tranquilo por não ter gorado as expetativas, apesar das inevitáveis limitações – tive ainda algumas apreciações externas que aqui partilho convosco.

As duas primeiras resumem o essencial do que foi dito pelos meus convidados para a apresentação do livro. Na transcrição para o papel dos seus discursos, ative-me ao mais essencial e procurei manter a vivacidade do seu discurso que – fui testemunha disso -fugiu em muito  ao “papel” previamente preparado, fixando-se no improviso.

Os dois outros comentários chegaram-me por via escrita, mas porque se tratam de pessoas externas à nossa realidade, partilho os mesmos convosco.

Adiciono ainda algumas fotos da apresentação externa.

 

SUSANA PERALTA

(Especialista em economia pública e economia política)

Talvez comece por explicar, como toda a gente já falou aqui da sua história de vida muito mais interessante e relacionados com o livro que a minha, a história que me trouxe aqui e que foi aqui o Pedro Strecht que me enviou uma mensagem a dizer que tinha um amigo que escreveu um livro sobre a vida no seminário e que gostava que eu apresentasse o seu livro, e eu disse logo que sim (…) e quando falo com o Manuel ao telefone disse-lhe que estava muito entusiasmada com esta possibilidade (…) porque, na verdade, na minha vida sempre houve um seminário, que é o seminário do meu pai, que está ali sentado (mas que não esteve neste seminário) e eu cresci  desde pequenina com este seminário e com tudo aquilo que ele trouxe de bem e de mal à vida do meu pai que também, tal como o Manuel e todas as pessoas que agora aqui falaram (exceto os freis que nos acolheram) saíram do seminário e lembro-me até de, quando era pequena, irmos lá aos fins de semana aos encontros tal como os vossos e que fazem parte deste livro – era o Seminário de Beja, onde o meu pai estudou alguns anos e que lhe permitiu ser o único dos seus seis irmãos, sendo ele o irmão mais novo,  o único que se licenciou e que de alguma forma esse seminário também me permitiu chegar onde cheguei, com tudo o que isso verdadeiramente tem de bom, porque eu tive a sorte de poder estudar, depois também de poder ir para fora fazer o meu curso  e doutoramento e hoje em dia ser professora de uma faculdade com o nome em inglês[1] (risos…) e a verdade é que, de algum modo, isso também se deve ao seminário!

Bom, então o Manuel veio ter comigo(…) e deixou-me este livro maravilhoso que eu li com muito interesse e que ele diz que não é autobiográfico (…). Do Manuel ficamos a saber muito pouco, temos esta inicial frase maravilhosa acerca da mãe do Manuel… é engraçado porque o livro é completamente masculino porque os seminários eram completamente masculinos, mas o primeiro parágrafo é para a mãe e, portanto, há aqui uma personagem do sexo feminino que me parece que foi absolutamente determinante, mas que apenas sugere…

E depois há também aqui uma coisa incrível que é a frase, logo a seguir ao parágrafo da mãe, do Leonard Cohen quando refere que “Há sempre uma fenda em todas as coisas…/É assim que a luz entra! (…) E isso é muito interessante  porque acho que esta fenda a que o Manuel se refere tem muitos significados na história da vida dele; mas também aqui no livro tem outra coisa que eu também acho incrível que é a história de vida no seminário e que o Manuel divide em três períodos embora eu vá considerar apenas dois momentos: um mais austero, com regras muito mais estritas, de silêncio, muito pouco centradas nos adolescentes que recebiam, e depois há um outro que corresponde a uma fase de renovação e de alguma abertura, que coincide com a visita de estrangeiros e que vêm trazer uma abertura e uma maneira de olhar diferente para aquele espaço que é, sobretudo, para os jovens se formarem, de algum modo um entendimento de que não vás ajudá-los a descobrir a vocação se não for com maior liberdade. Mas mesmo na fase mais austera a fenda estava lá…e é engraçado ver como no meio daquelas regras todas, de uma certa maneira profundamente anti-infantis, anti-adolescentes e e anti-tanta coisa(…), havia “fendas” (convívios, passeios) ainda que a fenda mais incrível seja esta amizade que vos une…

Mas, afinal, o que foram estes seminários? Estes seminários foram verdadeiras oportunidades destas pessoas se formarem porque, de facto, não ofereciam oportunidades às pessoas para fazerem a sua formação após o ensino primário. E não deixa de se constatar no livro a percentagem baixíssima das pessoas que ao longo das várias décadas passaram pelo seminário que, efetivamente, acabaram por seguir a vida religiosa. Mas isso também mostra – eu sei isso através da história do meu pai – que as pessoas iam muitas vezes para o seminário com uma vocação que em todo o caso entendiam verdadeira (embora eu seja verdadeiramente incompetente para falar de vocações) e, por isso, não quer dizer que as pessoas apenas se aproveitassem… aliás, o Manuel tem aqui uma parte muito interessante onde se discute o próprio processo de seleção e que tinha em conta não só as competências escolares e cognitivas dos jovens, mas também procuravam perceber a natureza da vocação porque, de facto, era uma escola para formar pessoas para a vida religiosa e custava dinheiro (aliás, há no livro também  toda uma parte acerca das propinas que era preciso pagar, mas, na prática, o  preço era verdadeiramente insignificante na maioria dos casos.

Mas também acho importante e interessante esta capacidade das pessoas que, depois de já estarem numa fase da vida que já têm tempo para isso, irem aos arquivos, investigar, descobrir os fios destas meadas que fazem parte deste vosso passado recente, tão recente (…) e que nós, em Portugal, temos tanta vontade em esquecer este passado que foi ontem, e que é um passado de grandes dificuldades materiais e emocionais (…) e, deste ponto de vista é fantástico!

De facto, o progresso deste país neste século é verdadeiramente fora de série, mas é sempre bom não nos esquecermos de que vimos daqui (…)!

Eu trazia aqui uns números, embora fique sempre com uma síndroma de impostora ao vir a esta plateia contar como era a vida neste país antes de eu nascer…

Acho, no entanto, que vale a pena lembrar alguns números…

No entanto, não havia naquela altura indicadores como os que utilizamos hoje como, por exemplo, a pobreza, em geral e a pobreza infantil, em particular (quem vive em casas mal aquecidas, quem tem limitações no consumo de calorias, etc.).  Há, ainda assim, alguns indicadores, uns mais fidedignos que outros porque já eram recolhidos de forma sistemática, como, por exemplo, os dados da mortalidade infantil. Assim, por exemplo, em 1960 a mortalidade infantil em Portugal era de 77,5 crianças por mil antes de chegarem ao primeiro ano de vida (em 2023 esta taxa é de 2,6).

E não deixa de ser interessante ver que a viragem que o Manuel descreve no seu livro de um ambiente de maior abertura e liberdade coincida, na verdade, com variáveis económicas. A mortalidade infantil começou, de facto, a baixar em meados da década de sessenta e quando olhamos para os dados da nutrição, nós vemos que, desde o final dos anos quarenta até ao início da década de setenta, a ingestão de trigo, por exemplo, aumentou em 50% per capita, a ingestão de arroz aumentou também em mais de 50%, bem como o consumo de ovos que são um bom indicador da ingestão de proteínas. Assim, segundo os dados do INE, em 1946/49 a ingestão de ovos era de 1,6/ano, per capita mas, já em 1990, esse número tinha-se multiplicado por 6, passando a 6,6 ovos per capita (…).

Já agora só mais duas dimensões:

A dimensão da habitação – mesmo em 1970, já após uma década de crescimento económico que foi substancial durante o Estado Novo – é preciso dizer – 29,4% das famílias viviam em alojamentos sem condições, insalubres (sem água, luz ou instalações sanitárias) e obviamente com grandes variações regionais – e isso se vê também bastantes vezes com a análise do Manuel, sendo que essa variação varia de 17,4% no distrito de Santarém a 45,3% em Vila Real o que tem alguma correspondência com as regiões de Trás-os-Montes e do interior muitíssimo representadas!

A dimensão da formação - (…) tenho aqui uma citação de um deputado nos anos quarenta na Assembleia Nacional que, falando do trabalho infantil, explica que a falta de jovens no ensino secundário se deve, de facto, o número de jovens que estão a trabalhar. E eu tenho aqui estimativas para os anos quarenta que nos dizem que havia cerca de 600.000 jovens do sexo masculino e até aos 19 anos a trabalhar e cerca de 370.000 jovens do sexo feminino. Diz então o referido deputado: “Quanto ao trabalho é sobretudo na família que ele melhor se ensina, ajudando as mães nas canseiras domésticas, nas lides de casa e, para os mais novos, tratamento de animais e trabalhos de campo mais simples. É aí que se inicia o trabalho infantil, o trabalho sério, porque o trabalho de escola é sempre uma brincadeira à vista deste. O trabalho doméstico e familiar, pela sua seriedade, desenvolve também o sentido das responsabilidades, o que não sucede nem pode suceder no trabalho nas escolas infantis. A formação da personalidade infantil desenvolve-se na luta, com as dificuldades, vencendo o imprevisto, fazendo trabalhar todas as forças físicas e morais do nosso ser! A escola é o contrário disto, é como a caserna, despersonalizante! Por isso, as condições de família são muito superiores às da escola para educar!”

Enfim, eu acho que este livro e também os exemplos de vida e os percursos destas pessoas que, depois, também muitas delas se licenciaram ou fizeram outras coisas incríveis, incluindo um deles, que - segundo aqui foi dito – se encontra, por exemplo, a celebrar hoje a luta num sindicato, e todos os percursos de vida que estão aqui mostram que a escola é muito mais do que  isso…

E, para terminar, penso que também é importante recordar que a Igreja Católica, com todos os seus defeitos e limitações, não deixou também de ser uma grande força de formação neste país!

Obrigado!


PEDRO STRECHT

(Pedopsiquiatra)

Vou começar por agradecer o convite do Manuel por estar aqui hoje e também aos Dominicanos por nos terem recebido aqui esta tarde (…) Dominicanos que conheço muito bem porque cada um dos meus três filhos também passaram cinco anos numa escola dominicana – Escola das Irmãs Irlandesas de Lisboa – e receberam do Fr. José Nunes a primeira comunhão e a profissão de fé (…) Portanto, tenho também esta pequenina ligação à Família Dominicana (…).

Este livro é uma grande viagem das nossas vidas – como disse aqui um amigo e companheiro do Manuel - do nosso país e da evolução de cada um de nós que, de facto, nos leva a ler com imenso gosto e que é uma delícia (…) e que  para mim não deixa de, por uma certa formação profissional, ao ouvir estas histórias, estar sempre a formar na minha cabeça imagens de cada um de vocês com 10 anos, 12, etc..!

E, como disse a Susana, se nós olharmos para trás e virmos a realidade social, política, educativa e económica do nosso país, se calhar para quase todos nós há algures um seminário nas nossas vidas familiares, algures uma colocação em internato que transportamos em cada um de nós, porque é aí que as nossas raízes também estão…!

Foi em Outubro de 1999 que eu, ainda jovem médico pedopsiquiatra, comecei a trabalhar no Centro Educativo Padre António de Oliveira, em Caxias, onde o Manuel era o diretor, paredes meias com a Prisão de Caxias e, por isso, também temos essa partilha monástica porque o mesmo se situava no antigo Convento da Cartuxa (…)!

E foi assim que nos conhecemos nesse instituto com o nome de Padre António de Oliveira (poderia ter sido noutro qualquer…) mas que bem simboliza a enorme intersecção, sobretudo no Portugal do S.XX, da Igreja e do Estado Novo, que caminharam muitas vezes lado a lado e que cada um, à sua maneira, deixou marcas imensas na estruturação assistencial  e caritativa da infância em Portugal.

E o que não vem por um lado vem por outro, num atitude que eu diria, por um lado, cuidadora, mas, por outro lado, reguladora do bem-estar, porque havia normas explícitas – até na sociedade em geral (…) e obviamente que sabíamos que essa formação era subordinada ao lema “Deus, Pátria e Família”, haverá ainda, claro, a tradição da moral e dos bons costumes(…)

Pinheiros, oliveiras e castanheiros – Todos eles nos trazem memórias sobre as caraterísticas destas árvores e o seu significado e as ligações que vamos fazendo como colegas, amigos e, no vosso caso, unidos por aquilo que foram as vossas experiências de aprendizagem, relação, etc., em tudo o que significa o mundo extrafamiliar. Mesmo para nós, que sempre vivemos com os nossos pais em casa e somos de uma outra geração, conhecemo-nos e conhecemos os outros em tudo aquilo que as crianças da escola, a escola e as vivências extrafamiliares nos foram trazendo de uma forma ou outra. Mas especialmente com muita mais força em quem, desenraizados da sua origem, viveram o seu crescimento, ensino e aprendizagem em espaços como o “casarão” (…) um lugar que era verdadeiramente lugares.

Há muitos anos atrás, um autor belga (Marc…) falou do “não-lugar”, justamente porque hoje em dia nós vivemos em muitos “não-lugares”, e realçando o facto de que os verdadeiros lugares, como estes casarões que vocês habitaram e transformaram em casas, são espaços simultaneamente de identidade e de relação com história. E nós hoje movemo-nos em espaços sem identidade, onde não há grande relação e que, provavelmente, não vão deixar uma grande história.

Este livro desenvolve-se – e é isso que eu acho brutal – como uma história, uma narrativa entre vós e, por isso, ele também se poderia chamar “Laços com nós” que nós desatamos para criar laços, porque é isto que sentimos em todos vocês, como uma grande família (…)!Depois, este livro não é apenas uma reposição de memórias, é também um retrato sociológico explícito do Portugal pós-guerra, desde a interioridade, a pobreza, a desigualdade, o analfabetismo, o forte pendor da Igreja sobre todas as populações, enquanto ascensor social, mas também como controlador social. E há, de, facto, um outro retrato que hoje em dia já não temos e que são muitas crianças em famílias numerosas, pais trabalhadores rurais ou em serviços básicos que hoje em dia chamamos cada vez mais verdadeiros ofícios e verdadeiras artes e mais cuidadores de um espaço-casa onde, de facto, alguns dos rapazes – como constatamos aqui – e só aqui apenas, se calhar, os mais dotados ou mais bafejados pela sorte (…) é que poderiam ir estudar para o seminário e foi assim que conseguiram dar um passo muito grande nas suas vidas pessoais, profissionais e, depois, familiares.

Nós sabemos muito bem – e aparece aqui referido em todas estas pequeninas histórias- que, apesar de tudo e independentemente das condições, estas crianças referem-nos a sua base segura, o seu espaço, a sua casa de família, o pai que sendo austero não deixa de ser pai.

E havia também uma coisa que eu acho que é muito importante e se tem perdido um pouco e que era, apesar de tudo, a capacidade de nós próprios, enquanto pais e pessoas, confiar nos outros (…) – O pai chegou ali (Caxarias), viu aquela pessoa vestida de branco e confiou! E alguém podia dizer, assim como me dizia há dias uma criança: “-Ah, mas ele pode ser pedófilo”, ao que eu disse: “- Pode, mas vamos pensar entre o possível e o provável: 99,4% das pessoas são normais”, portanto, vamos lá ter um bocadinho esta base de confiança que hoje em dia parece que nós perdemos, parece que só nós próprios sabemos fazer e não podemos passar esse testemunho a outros em que também podemos confiar!

Pinheiros, oliveiras e castanheiros - Todos nos falam da distância e da ausência, do que era partir e todos também nos falam do desejo de um futuro versus a estagnação presente e o futuro que, como alguém diz aqui no texto, é bem simbolizado pelo próprio nome do local – Aldeia Nova – como se qualquer de novo pudesse acontecer. Aldeia-Nova/nova aldeia em que todos se despiam de um passado recente e todos se davam a unir perante um desapego inicial comum que inclui a dor da perda, mas que prometia um novo crescimento individual, assente na ideia coletiva do grupo de pertença e de partilha – e julgo que é isto que ainda transparece hoje em dia nas vossas vidas!

E onde havia, com certeza, a construção de novas raízes e também o desenvolvimento das capacidades, das competências que muitos tinham, mas que, de outro modo, teriam ficado estagnadas, mantendo-se ciclos negativos de pobreza e desamparo (…)

Porque se foi também esta parte – digo eu – desta geração imensa que viveu os desígnios do Estado Novo e que também viu partir e morrer muitos seus para a guerra (…), também foi esta mesma geração – a vossa – que mais tarde teve a necessária força de mudar e a quem nós devemos a construção e consolidação da liberdade, em que hoje vivemos a

 

 

LUCIANO MARMELADA

(Psiquiatra)

 

Com uma escrita clara que não rejeita uma toada poética, filigranada por uma subtil espiritualidade, não sendo propriamente autobiográfico, o autor não se esconde na trama geracional que convoca.

O título do livro, remete-nos para a ruralidade de um Portugal e consequente subdesenvolvimento do “início da década de 50... o Portugal da oliveira, do pinheiro e do castanheiro” embalado “nas pancadas lentas e compassadas do martelo a esmagar o bronze do sino da velha torre da igreja”.

A narrativa leva-nos para territórios da “Ordem dos Pregadores (Dominicanos) em Portugal e no Mundo” e centra-se no Seminário Apostólico Dominicano da Aldeia Nova/Olival, Ourém, pedra angular do livro e da história da Renovação da Ordem em Portugal, que o autor enquadra com dados da sua investigação (ciclo de crescimento e consolidação 1943/1968, desenvolvimento e mudança 1960/1968, decreto conciliar, ciclo de transformação e novo modelo 1973).

Súbito, da narrativa, um brado: ”Não te esqueças Armando. Nós fazemos um grande sacrifício para te ter a estudar, ainda por cima tão longe. Estuda, filho”! Mais do que constituir frase tutelar que dá corpo ao texto, mais do que o lamento de uma mãe na contingência de ver o filho condenado a vender copos de vinho na taberna da aldeia, é o grito de revolta de alguém a tentar trocar as voltas ao destino.

O livro é intercalado por eloquentes testemunhos “daquela geração” de horizontes limitados em que o acesso ao seminário e a uma educação religiosa constituíam uma possível aposta num futuro melhor....“a pobreza...a possibilidade de estudar...o quantos fomos...de que tempos somos...com que idades entramos...de onde viemos...o papel dos párocos...porque fomos...que família era a nossa...como se entrava...a questão das vocações...o dia a dia no seminário...as horas difíceis...os que ficaram...os custos das mensalidades e a questão dos enxovais...quem ensina o quê, para quem e para quê?” são vivências que perpassam nos textos disponibilizados.

O autor reflete certas idiossincrasias institucionais da altura, como os regulamentos que regiam “a relação com os colegas” que, aos olhos de hoje, denotam uma visão deturpada da sexualidade dos adolescentes e na “relação com os superiores” que denunciavam visões de cariz teocrático (“os superiores são legítimos representantes de Deus, encarregados duma missão tão árdua, como benéfica”).

O livro não deixa de alimentar o nosso “voyeurismo” sobre o que os muros do seminário “escondiam”. Sobre este mistério, a minha geração retinha uma vaga memória de uma “Manhã submersa” de Virgílio Ferreira, ou mesmo da novela “Marcelino, Pão e Vinho” da nossa meninice, mais interessada no que se “passava para além dos muros dos asilos psiquiátricos”,analisados numa perspetiva freudomarxista.

Fica clara a contribuição da Ordem dos Dominicanos para a renovação do ensino religioso em Portugal e, consequentemente, a sua contribuição para a modernização do pensamento português. Os testemunhos recolhidos, refletem lapidarmente as vivências institucionais e pós institucionais dos protagonistas, tenham ou não seguido o múnus sacerdotal.


ONÉSIMO TEOTÓNIO ALMEIDA

(Professor Catedrático da universidade de Brown -USA, jubilado)

 

Hoje ia referir mais um livro recebido de oferta, mas decidi alargar-me num comentário.

A cultura portuguesa tem um capítulo de auto-censura que merecia ser estudado a sério: é o do papel dos seminários e conventos na formação de tanta gente que, tendo deixado essas casas de formação, desempenhou papéis relevantes na vida nacional (em todas as vertentes do espetro político; mas, para o caso, isso é irrelevante). Por um lado, temos gente como Salazar e António Ventura e, por outro, Miguel Torga, Vergílio Ferreira e José Mattoso, a encabeçar uma longa lista.

Esse estudo está por fazer. Não serei eu levá-lo a cabo pois não tenho já idade para isso, muito embora ainda pense em ir avante com a velhíssima ideia de escrever sobre a minha experiência no Seminário de Angra. Pelo menos para contar histórias.

(…)

Esta nota foi também impulsionada pela leitura (confesso que não página a página, todavia concentrei-me no essencial) de um notável livro que bem poderia ser uma tese de doutoramento: Pinheiros, Oliveiras e Castanheiros, um estudo histórico-sociológico do Seminário da Ordem Dominicana, da autoria de Manuel Branco Mendes (Espaço Ulmeiro, 2024). Graças ao Francisco Soares Torres (recebedor destas notas), que por lá andou (conhecemo-nos em 1970), possuo um exemplar do livro que recomendo vivamente (foto #1, da capa em anexo). Trata-se de um trabalho altamente informativo e ricamente ilustrado.

(…)



[1] Nova School of Business and Economics







segunda-feira, 2 de dezembro de 2024

ANIVERSARIANTES

 

Aniversários em Dezembro

Durante este mês celebram o seu aniversário os nossos Amigos

NOME                                                                 Dia

  António Manuel Gomes Cunha                                          2

  António Valente Mateus                                                  5

  Manuel Pires                                                              8

  Arménio Gonçalves da Costa                                            8

  Carlos Manuel Rodrigues                                                9

  Fernando Maria Faustino                                               12

  Rui Lopes Pinheiro                                                      15

  Nelson Amaral Veiga                                                    15

  Camilo A. F. Morais Martins                                             20

  Jose Luis Fernandes Lourenço                                         25

  Abel do Nascimento  Pena                                             31

Para todos os nossos parabéns e os votos de um futuro cheio de Bençãos de Deus.